O Beco das Almas Perdidas (Nightmare Alley – 1947)
Stanton Carlisle (Tyrone Power) trabalha em uma feira de
variedades, como uma espécie de golpista, sempre procurando um novo número à
custa da inocência de seus espectadores. Zeena (Joan Blondell), uma das
artistas da feira com quem ele tem um caso, acaba ensinando-lhe seu número
secreto. Mas seu coração não é de Zeena, e ele sequer pretende ficar
trabalhando para sempre no mesmo lugar.
O filme deveria constar em todas as listas de melhores
obras de sua década, não somente figurar como uma curiosidade no “Noir”. Adaptado
do excelente livro escrito por William Lindsay Gresham, que nesta obra pode ser
comparado com justiça aos melhores trabalhos de Edgar Allan Poe, esse macabro
conto sobre a degradação humana resiste como uma peça única na história da
Sétima Arte, mérito cada vez mais raro de se encontrar. A direção de Edmund
Goulding, de “Grande Hotel”, resiste bravamente à ação do tempo, conseguindo
suscitar no espectador moderno, acostumado com a banalização do suspense,
arrepios e uma sensação latente de estar pisando em um terreno completamente
novo, onde tudo pode acontecer. A abrangência de gêneros torna a experiência de
assistir pela primeira vez, ainda mais instigante. Para os mais atentos, vale
perceber as referências freudianas contidas na estrutura do roteiro, não
somente na figura da psicóloga vivida por Helen Walker, e a eficiente crítica
aos que vivem de conjurar ilusões, alimentando carências enquanto brincam
irresponsavelmente de serem deuses ou terem algum tipo de conexão com o
místico.
Tyrone Power lutou por este papel, pois via nele a
possibilidade de modificar sua persona cinematográfica. Uma decisão corajosa e
muito acertada, pois em meio a tantos heróis de capa e espada e típicos galãs
vividos em sua carreira, seu Stanton Carlisle pode ser considerado seu melhor
momento como ator. O roteiro joga com o espectador durante os primeiros dois
atos, fazendo com que em seu desfecho não confiemos em nada que ele nos
apresenta. Somos apresentados a variados personagens em um modesto circo
itinerante, uma cartomante, um bêbado que atua como um selvagem, os chamados
“geeks”, aberrações de circo, mordendo cabeças de galinhas vivas, mentalistas
e um jovem orgulhoso que sonha muito alto, o que no beco das almas perdidas
pode ser um terrível problema. Óbvio que detalhar a trama é o maior crime que
eu poderia cometer neste texto, mas recomendo que esse tesouro seja descoberto
o quanto antes.
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