E.T. - O Extraterrestre (E.T. - 1982)
Assistir “E.T. – O Extraterrestre” quando eu era criança,
assim como dançar ao som do “Trem da Alegria” e considerar o máximo gravar as
vozes dos artistas da televisão no gravador “Meu Primeiro Gradiente”, são
momentos indeléveis na minha memória. O filme de Steven Spielberg pode ser
considerado um pilar no ritual de amadurecimento infantil, pois inicia
entregando os mesmos elementos dos contos de ninar (mistério antes da aparição
do alienígena, quase como um “bicho papão”), seguido por situações de humor
típicas da inconsequente pré-adolescência (os sapos na escola, o alienígena com
roupa feminina), dando bastante espaço para a escapista aventura adolescente (o
enfrentamento das crianças com os adultos) e finalizando com questões maduras,
como a aceitação da finitude (morte do alienígena) e a necessidade adulta de
saber se desapegar (alienígena voltando para seu planeta).
Em 11 de Junho de 1982 estreava nos cinemas americanos esta
emocionante produção, que reafirmaria o talento de seu jovem diretor e
encantaria crianças e adultos do mundo todo. A razão do sucesso não reside na
inegável competência do departamento técnico (Carlo Rambaldi elaborou a figura
do E.T. de pescoço longo e olhos enormes), mas no relacionamento construído
entre o pequeno Elliot (Henry Thomas) e seu amigo das estrelas. Como muitos de
nós na mesma idade, o garoto abraçava a solidão de seu quarto colorido, pois
dividia a atenção da mãe com seus irmãos. Sofrendo a ausência paterna (os pais
haviam se separado), enclausurava-se em seus brinquedos e nas aventuras
fantásticas criadas pela sua imaginação.
Spielberg faz-se notado nos olhos de deslumbramento de
Elliot ao deparar-se pela primeira vez com o alienígena, que compartilhava sua
solidão (havia sido esquecido por seus pais na Terra). O cineasta sofreu quando
criança com a separação dos pais e mantinha amizade com um ser imaginário, uma
experiência que o ajudou a traduzir com sensibilidade autobiográfica esta
ansiedade infantil diante do desconhecido. Enquanto Elliot representava o diretor
quando criança, o personagem vivido por Peter Coyote simbolizava a busca do
Spielberg maduro por suas reminiscências infantis. Em certo momento ele revela
ao garoto, que ele aguardava ansiosamente pelo momento em que finalmente iria
ver o alienígena que alimentava seus sonhos de infância. A importância de ter
sua crença respondida na figura daquele ser de outro mundo, como uma
confirmação de que havia valido a pena atravessar toda uma vida de infortúnios
mundanos, por uma oportunidade breve de testemunhar um relance de fantasia.
O momento mais famoso representa muito mais que uma criativa
solução narrativa para uma cena de ação. O voo das crianças nas bicicletas pelo
céu, deixando para trás a comodidade e os medos típicos dos adultos, simboliza
aquele instante mágico nas vidas de todos nós, quando percebemos o “abismo” à
nossa frente, mas ao invés de instintivamente buscarmos a proteção materna,
simplesmente aceitarmos a desistência ou adiarmos a decisão, descobrimo-nos
capazes de prosseguir (graças ao elemento da fantasia/ "mágica" do
alienígena) na jornada com um corajoso “salto de fé”, tocando com pés descalços
a terra firme da maturidade, aptos a novos e instigantes desafios.
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