Hiroshima Meu Amor (Hiroshima Mon Amour - 1959)
Inicialmente seria apenas um documentário sobre a tragédia
de Hiroshima, porém Alain Resnais sabia que era impossível falar sobre evento
tão desumano. O diretor elaborou (com Marguerite Duras) então um roteiro que
tratasse sobre a impossibilidade de se falar sobre Hiroshima, uma fusão entre
elementos fictícios e o retrato real e pungente dos efeitos da tragédia em um
povo. Para tão nobre intento, o diretor francês utilizou referências
filosóficas, literárias e políticas, emoldurando uma "pintura" que
poderia ser vista (por olhos menos atentos) como um conto de amor bastante
simples. O muito elogiado início da obra, onde uma voz emoff repete:
"Você não viu nada em Hiroshima", enquanto cenas reais e
perturbadoras de destruição são mostradas, remete diretamente a um ideal
Aristotélico, pois fica claro que o sentido desta repetição é
essencialmente estimular uma catarse, devido ao medo e à piedade.
O romance (que guarda certa similaridade com o demonstrado
por David Lean em "Desencanto") entre a atriz francesa (vivida por
Emmanuelle Riva) e o jovem arquiteto japonês (vivido por Eiji Okada) é tratado
como um "meio" que visa um "bem maior". Seus personagens
não possuem nomes, suas memórias se entrelaçam na trama (inovador, foi o
primeiro filme em que os "flashbacks" e o tempo real se misturavam),
formando uma experiência sensorial quase hipnótica. O relacionamento entre o
casal é claramente alegórico, como quando Emmanuelle narra ao personagem de
Okada suas desventuras amorosas na cidade de Nevers, recriando (e moldando) os
fatos de acordo com o conforto que aquelas memórias trazem à sua consciência,
como se estivesse deitada no divã de um psicólogo. Incrível imaginar que
tamanha ousadia nascesse da mente de um diretor em seu primeiro longa-metragem.
"Hiroshima Meu Amor" é a batalha entre o desespero
advindo da constatação de uma trágica realidade e aquele (tão arrasador quanto)
que nasce da impossibilidade de esquecê-la.
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