O Tambor (Die Blechtrommel -1979)
"Nós, duendes e tolos, não deveríamos dançar no
concreto, que foi feito para gigantes”.
Utilizando-se de fantasia, o diretor Volker Schlöndorff (adaptando
a complexa obra de Günter Grass) contou a história do pequeno Oskar Matzerath (David
Bennent), que decide não mais crescer após frustrar-se com os adultos e
perceber o horror da Segunda Guerra Mundial, escolhendo viver de sua própria
maneira ao lado da única coisa constante em sua vida, um presente dado quando
ele tinha três anos de idade, um pequeno tambor vermelho e branco (que
psicologicamente substitui o som das batidas do coração de sua falecida mãe). Oskar
realmente interrompe seu crescimento e pelos mesmos motivos que Peter Pan, por
saber que o mundo dos adultos é cruel e hostil (sua atitude egoísta e
indiferente espelha a infantilidade do povo alemão da época, assim como o
fascismo que se espalhava). Porém consegue impor-se e superar suas limitações
em meio a um discurso nazista em praça pública, quando com seu pequeno tambor
consegue transformar a opressiva marcha militar em uma bela valsa que leva toda
a população a dançar.
Oskar é utilizado como uma ferramenta artística designada a
expor a sua sociedade, que é vista por sua ótica (a câmera baixa, ao nível dos
olhos de uma criança). Quando rejeita a proposta de um anão a participar de um
circo (“prefiro fazer parte da plateia”), deixa evidente estar avesso a tomar
partido de algo (como os adultos da época, avessos a se responsabilizarem). O
anão afirma que todos os pequenos precisam unir-se e guiar o show, caso
contrário outros irão tomar o controle e levá-los à destruição. “O Tambor” é
ousado em sua crítica e merece ser visto várias vezes, sempre adicionando novas
camadas de interpretação àquele que o prestigia. Tesouro que merece ser
garimpado.
Os Meninos da Rua Paulo (A Pál Utcai Fiúk - 1969)
Baseado na obra do húngaro Ferenc Molnár, este é daqueles filmes que uma vez vistos, mantém-se eternamente na memória. Não se assuste se em sonhos, você se surpreender combatendo na Rua Paulo ao lado de seus amigos de infância. Adaptar a obra literária húngara mais famosa de todos os
tempos para o cinema não deve ter sido fácil, mas o diretor Zoltán Fábri
conseguiu o feito, sem apelar para pieguices exageradas ou extrema austeridade,
como seria comum na maneira americana de lidar com temas assim.
A história relata as batalhas de pré-adolescentes humildes na
Budapeste de 1889, que defendem um terreno baldio (palco de suas brincadeiras)
da invasão de um grupo de adolescentes ricos. O confronto ingênuo permeado de
“bombas de areia” e empurrões acaba levando às mesmas conseqüências tristes de
qualquer guerra. Existe uma hierarquia no exército da Rua Paulo, onde o
frágil e esforçado soldado raso Nemecsek tenta a todo custo demonstrar seu
valor perante o corajoso general João Boka. Nasce destas situações um humor que
nos remete facilmente ao mundo complexo da criança, pois eles não lutam por
alguns metros quadrados em um terreno baldio, lutam para conquistar a liberdade
e pelo direito de exercerem plenamente sua criatividade.
Como em todas as guerras, existem traições e demonstrações
de valor nas condições mais extremas. Tanto o livro quanto o filme deixam
bastante claro suas analogias e reais intenções: mostrar que, ao contrário do
que muitos pensam, a infância é tão densa e conflituosa quanto a idade adulta.
“Os Meninos da Rua Paulo” é um filme obrigatório.
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