Delírio de Loucura (Bigger Than Life – 1956)
Durante a década de sessenta, o diretor Nicholas Ray (de
“Juventude Transviada”) foi reverenciado pelos críticos franceses como um
valoroso autor, porém desperdiçou (auto-sabotou) sua carreira em Hollywood com
excessos dos mais variados tipos, culminando na conturbada filmagem de “55 Dias
em Pequim” (1963) (similar ao que ocorreu com o francês Henri-Georges Clouzot
nas gravações de “O Inferno”, no ano seguinte). Incapaz de conseguir pôr em
prática sua plena criatividade, ele vagou em desequilíbrio constante por algumas
produções fracas (algumas sendo incapaz de finalizar), falecendo de um câncer
no pulmão em 1979. Ray conseguiu subverter um gênero que considerava
convencional (pensamento que deixa claro no filme que abordo, quando James
Mason percebe o filho assistindo um faroeste na televisão e afirma: “é sempre a
mesma coisa”), com seu faroeste “Johnny Guitar” (1954), onde de forma ousada
insere Joan Crawford como protagonista em uma trama usualmente machista.
Corajosamente assumiu a direção do belo épico bíblico “Rei dos Reis” (1961),
porém nota-se que o controle era do produtor Samuel Bronston, com um didatismo
exagerado (provavelmente imposto) que não combinava com o estilo do cineasta.
“Delírio de Loucura” foi um fracasso nas bilheterias
americanas em sua estreia, mas muito elogiado pelos críticos franceses (Godard
chegou a citá-lo como um dos dez melhores filmes americanos falados). O tema
abordado era muito contundente em sua crítica. A sociedade americana de 1956
não havia se acostumado sequer ao Rock and Roll dançante de Elvis
Presley (os pais ainda consideravam-no um enviado do inferno para destruir a
juventude), imaginem o abalo que causou uma trama onde um respeitável pai
perdia o controle e ameaçava matar seu próprio filho. Consigo até imaginar as
pessoas se levantando das cadeiras e deixando as sessões antes do término.
Acredito que o escritor Stephen King tenha utilizado suas lembranças deste
filme para a construção de seu livro “O Iluminado” (1977), já que existem
muitas similaridades no conceito.
James Mason (que também co-roteirizou e produziu) vive um
professor que, buscando uma vida mais estável para sua família, acaba dividindo
seu tempo entre seus alunos e seus passageiros em um táxi. O árduo esforço
faz-se sentido em seu corpo, levando-o a depender de cortisona (uma relativa
novidade à época), única salvação possível para uma rara e fatal inflamação nas
artérias. Normalmente tímido, progressivamente vai se fascinando com a
desenvoltura artificial (mudanças bruscas de temperamento), causada pelo uso da
substância. A progressão do vício é simbolizada de forma simples, mas
eficiente, pela câmera de Ray em momentos específicos (em contra-plongée, que é
quando a câmera filma o objeto/pessoa de baixo para cima, abaixo do nível dos
olhos), mostrando-o como um gigante (inclusive em sua sombra refletida na
parede), coerente ao título (“Maior que a Vida”) e ao artigo de jornal que
originou a obra: “Ten Feet Tall”. O personagem sentia-se um gigante quando sob
o efeito da droga, levando-o com o tempo a descarregar em seu filho todas as
suas frustrações. Neste momento a crítica à sociedade paternalista americana (presente
em sua filmografia, como no já citado “Juventude Transviada”), toma ares de
filme de terror, porém não mais revelarei em respeito à experiência do leitor.
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