007 - Operação Skyfall (Skyfall - 2012)
Os produtores souberam trabalhar este projeto como uma justa
homenagem aos cinquenta anos de sucesso, mas acima disto, uma redenção digna de
constar nos anais da história da Sétima Arte. Manter-se no jogo cruel e
burocrático desta indústria por tantas décadas, sobrevivendo a mudanças de
comportamento da sociedade, com tanta jovialidade e frescor, não é algo fácil. Além dos vários problemas ocorridos no anterior, que sofreu
com a greve de roteiristas, havia ainda a falência da MGM (como é bonito
assistir o leão rugindo logo no início, como se resistisse a perecer) e o
descrédito de muitos, que debochadamente diziam que o personagem de Ian
Fleming estava irreconhecível em obras boas de ação, mas que continham
mais elementos de Jason Bourne. "007 - Operação Skyfall" não é
somente um excelente filme dentro da franquia, mas também um atestado de
competência empresarial. Barbara Broccoli, com o auxílio de Michael Wilson, carrega o legado de seu pai com elegância. Após dois projetos de origem, onde
apresentava o protagonista como uma ferramenta bruta a ser desenvolvida,
entrega desta vez o James Bond idealizado por Fleming e "Cubby", seu
pai. Respeitando ambas as fontes, presenciamos os elementos distinguíveis em
sua versão literária e cinematográfica (lembraram até mesmo de incluir uma
lembrança àqueles one-liners bem-humorados, que sempre apareciam
após os feitos mais absurdos do herói, como o homem que sempre olhava assustado
para sua garrafa, nas obras com Roger Moore), como a presença de animais
exóticos, vilões com objetivos megalomaníacos e seus esconderijos criativos.
Daniel Craig está totalmente confortável no personagem,
que desta vez enfrenta a si mesmo, física e mentalmente. Levado a buscar em seu
passado, que sempre buscou esquecer, a força que necessita para continuar
realizando seu trabalho, mesmo que o governo de seu país o considere uma
relíquia dispensável em um mundo onde um jovem de pijamas em seu laptop pode
ser mais eficiente que ele. Skyfall é a propriedade de sua família na Escócia,
local rústico cheio de passagens secretas. Em uma delas reside a essência
inocente daquela criança de outrora, elemento captado com sensibilidade nos
créditos de abertura, mostrando o olhar do personagem escondido atrás dos
escombros, como que se escondendo. Simbolicamente representa o único elo entre
o garoto medroso que ele um dia foi e o homem audacioso que precisa ser.
"M" (Judi Dench) é presenteada pelo roteiro de Neal Purvis, Robert
Wade e John Logan, com algo que provavelmente será tido daqui a
vários anos, como a ideia mais criativa da franquia. Ela já representava a
figura materna, desde os filmes com Pierce Brosnan, mas no alto de seus quase
oitenta anos, tornou-se a Bond Girl mais importante da franquia, inclusive, se envolvendo na ação. Além de ser uma bela homenagem à atriz, também se
mostra eficiente no cânone cinematográfico do personagem, pois Bond precisava
desatar os laços que o prendiam psicologicamente ao seu passado (Skyfall e a
excelente inclusão do clássico Aston Martin DB5) e à sua "mãe", para
somente então personificar plenamente o 007 que o mundo conheceu em "Dr.
No". O desfecho coerentemente fecha esse círculo.
A direção de Sam Mendes é elegante e
inteligentemente autoral, mas sem nunca esquecer que precisa entregar o que os
jovens fãs buscam, mas também abraçar aqueles que assistiram Sean Connery no
cinema. Ele conduz os acontecimentos com o herói, potencializando o medo em
suas variadas formas: medo de ser substituído, medo de ser superado, medo da
solidão. Como consequência, humaniza-o sem descaracterizá-lo. O vilão Raoul
Silva, vivido brilhantemente por Javier Bardem, busca vingança contra
"M", ela o abandonou quando era um agente do MI6, mas, na realidade, sofre mais pelo ciúme do carinho que ela nutre por Bond. Ao fazê-lo claramente
homossexual, ainda que, felizmente, fugindo da estereotipação, o roteiro
entrega diálogos inesperados e engraçados, como quando ele tenta seduzir o
herói, que está amarrado em uma cadeira. Ralph Fiennes (Gareth
Mallory, o "M" que nos acostumamos a ver sendo interpretado por
Bernard Lee, só que numa versão mais jovem), Naomie Harris (uma Eve
Moneypenny muito mais interessante, tendo estabelecido uma real química com o
herói, algo que torna o usual jogo de sedução entre os dois, muito mais
verossímil) e Ben Whishaw (um "Q" adolescente,
possibilitando um relacionamento de irmão mais novo com 007)
completam a gênese da criação de Fleming, preenchendo lacunas que até os fãs
mais esperançosos não acreditavam que seriam preenchidas. A homenagem só não
fica perfeita, pois é claramente perceptível, até na forma escolhida para
introduzi-lo na cena, que o personagem vivido por Albert Finney no
terceiro ato foi idealizado para ser interpretado por Sean Connery, ou outro
ator que encarnou o espião, o que chega a fazer o espectador se frustrar ao
ser revelado outro intérprete, que mesmo sendo excelente e renomado, não parece
adequado.
A trilha sonora de Thomas Newman reforça o retorno
ao passado e a elegância inerente ao personagem. A bela canção-título, uma
excelente interpretação de Adele, traduz com perfeição o tom da trama, aquilo
que realmente está em jogo, a relação entre Bond e "M" ("...
você pode ter o meu número, o meu nome, mas nunca terá meu coração... eu sei
que nunca me imporia, sem a segurança de seu abraço carinhoso, afastando-me do
perigo... deixe que o mundo acabe, enfrentaremos juntos"). Felizmente, Daniel
Kleinman está de volta, construindo a cena de créditos mais corajosa desde
os anos em que Maurice Binder orquestrava as belas silhuetas femininas. A
produção foi um tremendo sucesso de crítica e público, o primeiro na franquia a
superar a marca de um bilhão de dólares pelo mundo, provando que o carisma do
personagem ainda é capaz de emocionar um público cada vez mais anestesiado.
James Bond nunca será obsoleto.
O personagem, enfim, retornou aos moldes, abraçou novamente
sua fórmula vitoriosa. E sabem o que é mais impressionante? Após cinquenta anos
e tantos obstáculos vencidos, ele prova que a melhor maneira de atuar ainda é à
moda antiga.
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