sexta-feira, 17 de janeiro de 2014

Quem Lucra com a Mediocridade?

Estamos vivendo um momento muito importante na história cultural deste país, uma genuína “Crise de Seldon” (profético Isaac Asimov) que definirá o futuro da sociedade. Todo e qualquer arroubo criativo que exceda os padrões ditos normais, garante posto eterno de perturbador da paz àqueles que os praticam. Posto este, incensado pela mídia e devidamente abraçado por um público, surpreendentemente indiferente aos cordões que lhes manipulam diariamente. Ato este, alimentado por vários anos, como que em um processo irresponsável de mediocrização popular. Aquele senhor de fraque e cartola que aplaudia no Teatro Municipal as obras de Schubert, hoje assiste seus filhos e netos “indo até o chão” ao som do Funk. Aquelas músicas populares de letras tão lindas de outrora, hoje são apenas refrões simplistas envoltos por um “La,La,La” dispensável e irritante. O sertanejo, que antes era de raiz, hoje é uma vitrine para jovens criados no ar condicionado, porém que mantém o chapéu e a atitude de quem passou a manhã inteira ordenhando vacas. Até mesmo o “Hip-Hop” que antes falava tão realisticamente sobre as mazelas do país, hoje foi diluído e parece servir apenas para exultar cafetões e mulheres fúteis. Parafraseando Edu Lobo, o problema hoje em dia não parece mais ser: “quem me dera agora eu tivesse a viola para cantar”, mas sim: alguém escutaria?

Estamos em pleno 2014 e nossos jovens desaprenderam a escrever (algo inclusive incentivado pelos nossos governantes). O mundo moderno lhes deu instrumentos: Facebook, Twitter, celulares cuja função menos importante é aquela inventada por Graham Bell, “trocentas” opções de canais de televisão visualizados em telas gigantescas em 3D, “máxima megalomania, porém monocórdia mesmice” (parafraseando o genial Chico Anysio). Deram-lhes asas, porém não os ensinaram a voar, ou não os contaram que era possível tal feito. O resultado é visível a qualquer um que realmente se importe em ver: mídias de redes sociais desperdiçadas com correntes tolas e mal escritas. Ofensas indiretas (direcionadas a alguém que provavelmente não perceberá que é o alvo) e seu direto oposto: o egocentrismo. A carência da sociedade nunca se mostrou tão cruelmente perceptível como hoje.

Evitando me perder em meus próprios devaneios, voltarei minha atenção novamente para o foco inicial. O politicamente correto parece ser a consequência natural dos vários anos deste processo (reversível) de mediocrização. Comediantes são levados a sério e condenados, enquanto políticos são vistos como astros pop. Volte Andy Kaufman, pois o mundo precisa de você. Aliás, a lembrança desse incrível artista foi o que me motivou a escrever este texto. Para aqueles que nunca ouviram falar nele, indico o ótimo filme de Milos Forman: “O Mundo de Andy” (Man on the Moon – 1999), em que Jim Carrey interpreta este ícone do humor americano. Resumindo bastante, Kaufman era um jovem anárquico e brilhante, que chocava plateias com seu senso de humor peculiar e com grandes (bem orquestradas) armações. Ele era capaz de trocar sopapos com donas de casa em um ringue de luta greco-romana ou subir em um palco e calmamente ler “O Grande Gatsby” até a plateia começar a vaiar, assim como também podia ir a um “talk show” e apresentar três delinquentes do Harlem como seus filhos adotivos, sem esboçar o menor sinal de que estava brincando. Andy não temia os limites do humor, ele apenas os subjugava e os ultrapassava.

O humor tem limites? Quem os estabelece? Façamos um exercício criativo e por um momento imaginemos como seria o mundo, ditado pelo politicamente correto atual. Não haveria com certeza espaço para grupos como o “Monty Python” ou artistas como Andy Kaufman e Lenny Bruce. Chico Anysio e seu humor elegante, porém ácido e crítico, também não teria tido oportunidade. Mazzaropi e o machismo de seu “Jeca Tatú” seriam motivo de processos semanais. O que dizer da língua afiada de Groucho Marx e das tubaínas de Mussum? Estaríamos fadados a um mundo asséptico, composto por humoristas comportados (elemento antagônico ao próprio humor), programas de televisão “chapa branca” e suas piadas bobinhas, que ofendem somente a inteligência do público. Maldito mundo moderno.

A pergunta que se mantém, enquanto comediantes recebem mandados de prisão e políticos corruptos miraculosamente os evitam é: quem está lucrando com esta mediocridade?
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