segunda-feira, 27 de junho de 2016

"Debi e Lóide - Dois Idiotas em Apuros" e "Debi e Lóide 2", de Peter e Bobby Farrelly


Debi e Lóide – Dois Idiotas em Apuros (Dumb and Dumber – 1994)
Debi e Lóide 2 (Dumb and Dumber To – 2014)
Nada é mais difícil que fazer rir, dar uma boa gargalhada então, mais difícil ainda! Exatamente por isso o gênero da comédia sempre foi menosprezado pela crítica e os seus gênios nunca recebem o aval de premiações. Uma comédia de qualidade requer talento, sensibilidade no timing, um instinto específico para desafiar as expectativas e uma boa dose de carisma. Como não ousam enfrentar esses artistas, um esforço é feito na intenção de minimizar seus trabalhos, marginalizando o humor como arte menor, normalmente elevando dramas umbilicais modorrentos à posição de destaque intelectual, com seus defensores formando uma espécie de maçonaria de medíocres prolixos, abusando de chavões batidos como: “não é um filme para todo mundo”. E, sem pensar duas vezes, troco qualquer exercício pretensioso desses diretores por uma tarde divertida vendo “Debi e Lóide”.

O filme de Peter e Bobby Farrelly é primoroso em sua capacidade maravilhosa de desprezar todos os elementos narrativos que garantiriam a respeitabilidade dramática de sua trama, que envolve um caso de sequestro em que o processo da entrega da mala com o dinheiro do resgate é interrompido por uma pessoa alheia ao ocorrido. O homem comum que se vê inserido em uma situação perigosa, como nos melhores suspenses de Hitchcock, passa a ser então perseguido pelos criminosos. Mas quando esse homem comum é interpretado por Jim Carrey, no auge de sua carreira, somos presenteados com um road movie de ritmo implacável e movido por suas caretas, o deboche com a formalidade ritualística que aprendemos desde cedo a respeitar. Ao invadir a casa dele, o gângster afirma ser um desperdício destruir o local como forma de ameaça, já que, bagunçado como está, o dono sequer perceberia alguma modificação. Quando o herói conquista em seus sonhos o carinho da mocinha, belíssima Lauren Holly, ele faz questão de satisfazer o voyeurismo natural dos cinéfilos levantando rapidamente a saia dela. O estilo sem polimento dos diretores cai como luva nessa desconstrução, unindo o humor mais grosseiro, simbolizado no primeiro filme pelo periquito sem cabeça vendido para uma criança cega, com a pureza ingênua das anedotas que escutamos na infância. O toque mais esperto nos dois filmes é fugir da armadilha melodramática abraçada por boa parte das comédias de sua época, uma inconsciente maneira do roteiro tentar se desculpar por ser engraçado e conquistar apreço dos pseudointelectuais que, na necessidade constante de autoafirmação, cospem naquilo que é popular. Os irmãos Farrelly, analisando o conjunto de obra, demonstram orgulho e segurança em seu ofício. E estão bem acompanhados, já que tanto o personagem vivido por Jeff Daniels, o melhor amigo e parceiro de pegadinhas, como o próprio Carrey, em seus cortes de cabelo exóticos nos remetem aos Três Patetas, representantes dessa graciosa irresponsabilidade cômica.


Acho curiosa a recepção negativa com o reencontro da dupla em “Debi e Lóide 2”, vinte anos depois, uma celebração muito pedida pelos fãs do original. O que os críticos esperavam? Muito se escreveu sobre a atitude dos protagonistas, praticando as pegadinhas mais escatológicas. É a evolução natural, atualizada para o humor que é atraente na sociedade hoje, basta você analisar o tipo de brincadeira que faz sucesso na internet, gente que ganha dinheiro comendo baratas e se machucando, a tolice hilária de youtubers como os Irmãos Piologo, toda essa geração que cresceu com Jackass e Pânico. Se você considera o humor dessa sequência menos inteligente, olhe com mais atenção o mundo à sua volta. Não podemos culpar o carteiro pelo conteúdo da carta, nem o espelho pelo reflexo que nele enxergamos. Temos a reutilização de gags, o rápido passeio no icônico carro-cachorro e o terceiro ato agitado que homenageia a estrutura das comédias da década de noventa, em que qualquer história conduzia a uma correria desenfreada em bobas cenas de ação bagunçadas, herança dos clássicos no gênero da década de sessenta, como “O Que é Que Há, Gatinha?” e “Deu a Louca no Mundo”. Os diretores dessa vez demonstram ainda menos apego narrativo, transformando tudo em uma grande pegadinha, o que simboliza maior segurança no estilo, o que considero um mérito relevante. 

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