quarta-feira, 28 de outubro de 2015

"Apanhadora de Sonhos", de Kim Longinotto


Apanhadora de Sonhos (Dreamcatcher - 2015)
Brenda Myers-Powell sobreviveu a uma infância imersa na violência, sofreu abuso sexual desde os quatro anos, adentrando, em sua juventude, no ingrato mundo da prostituição. Ela lutava para manter alguma paz interior de forma lúdica, conversando com amigos imaginários, seus ídolos na música: Elvis Presley e Diana Ross, com quem dançava na solidão de seu quarto, inconscientemente fortalecendo seu espírito. Com quatorze anos, já tinha duas filhas. Anos depois, ao invés de buscar fama relatando suas experiências, ela preferiu trabalhar nas sombras, investindo seu tempo na construção da Fundação Dreamcatcher, visitando os bairros mais pobres e presenteando mulheres tão sofridas quanto ela, vítimas de todo tipo de agressão física e psicológica, com a esperança de quem percebe um reflexo diferente no espelho da vida.

A esperança envolta em um sorriso acolhedor, uma alegria que encoraja e afasta o danoso, porém, nesse caso, compreensível vitimismo. A diretora Kim Longinotto acompanha essa heroína, que, numa demonstração de tremenda resiliência, conseguiu manter intacta sua autoestima, sempre cuidando de sua imagem, em suas visitas regulares a prisões e centros de detenção juvenil. É impossível não se encantar por ela, pura simpatia e gentileza, provendo estranhas com auxílio prático, distribuindo camisinhas, além de dedicar também um tempo generoso ao ato mais precioso: escutar, sem julgamento, sem aquela superioridade típica dos hipócritas, o clássico tão popular no Brasil: “agora encontrei Jesus e sou melhor”, nada disso. Sua bondade é genuína, conseguindo, com seu olhar carinhoso, transformar o local mais opressivo, por alguns minutos, em um espaço de plena tranquilidade, possibilitando terreno fértil para que os corações mais sofridos consigam desabafar.

A câmera apenas observa à distância, a diretora não tem interesse em deixar sua impressão digital em cada cena, equívoco comum em documentários. Sem apelar para qualquer recurso de estilo que pudesse manipular o registro, evitando o sensacionalismo até mesmo nos momentos mais impactantes, “Apanhadora de Sonhos” é um documentário verdadeiramente essencial. 
Comentários
1 Comentários

Um comentário:

  1. Só o nome do filme garante o valor esperado. Adorei sua definição pra história, foi ótima!

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