domingo, 18 de janeiro de 2015

"No Paiz das Amazonas" / "Copacabana, Mon Amour"


No Paiz das Amazonas (1922)
Na ocasião do centenário da Independência do Brasil, em 1922, o comendador J.G. Araújo, acreditando plenamente na capacidade do diretor Silvino Santos, em quem investia altas somas, convocou o amigo para produzir um filme que vendesse o Amazonas para o mundo. É difícil imaginar o impacto das imagens no público da época, já que basta trocar de canal, para encontrar a vida selvagem filmada em cores e em (super) câmera lenta, mas era uma mistura de espanto e deslumbramento. A câmera nunca se mostra passiva, é manipulada por alguém que entende a necessidade de utilizar a imagem como construtora de mitos, invertendo sequências, potencializando a tensão em uma realidade comum, com momentos de pura poesia visual. Ele registra em detalhes o trabalho com a extração de látex, a pesca dos pirarucus e dos peixes-boi, a rotina dos índios Parintintins, mas nunca resvala na monotonia. Assistir a obra, ainda hoje, faz qualquer apaixonado por cinema se quedar boquiaberto. É interessante analisar que, no mesmo ano, foi lançado o documentário celebrado mundialmente: “Nanook, o Esquimó”, de Robert Flaherty, que não sobreviveu ao teste do tempo com a mesma elegância. Um trabalho que mostra uma Amazônia lúdica, que faz parte do imaginário aventuresco e inteligentemente ordenado segundo o ponto de vista de Silvino, que, na adolescência, se apaixonou pelo local visto em uma gravura, tendo, desde então, objetivado capturar aquela versão mítica com sua lente.


Copacabana, Mon Amour (1970)
Na comédia experimental de Rogério Sganzerla, com trilha tropicalista de Gilberto Gil, a provocante Sônia Silk, vivida por Helena Ignez, é uma espécie de Barbarella que transita no universo caótico de personagens exóticos do morro carioca, perseguida pelo fantasma de sua loucura e constantemente maldizendo a velhice e a miséria. Um macumbeiro, uma prostituta que sonha ser cantora de rádio, elementos de um submundo que desconstrói as convenções, zombando de tudo e todos em tom gritado, com discurso subversivo, num espírito de anarquia que reflete o período conturbado em que o Brasil se encontrava. A câmera evidencia os dois mundos radicalmente opostos que habitam o mesmo espaço, o morro e o asfalto, preocupando-se mais em dar voz às reflexões dos personagens, sem uma estrutura linear, palavras soltas e repetições, intercalando pensamento falado e afirmação, como Saramago, uma linguagem literária em um meio audiovisual. A mulher que berra a negação de ser tarada, após sofrer uma tentativa de abuso sexual, como forma de apertar a ferida aberta de uma sociedade machista que, até hoje, culpa a mulher pelo estupro. A estranheza consequencial faz parte da catarse proposta pelo diretor. 

* Os filmes estão sendo lançados em DVD, pela distribuidora Versátil.

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