quarta-feira, 13 de agosto de 2014

"Nebraska", de Alexander Payne


Nebraska (2013)
Em alguns momentos na beleza da fotografia em preto e branco, mérito de Phedon Papamichael, senti uma forte inspiração em “No Decurso do Tempo” (Im lauf der zeit – 1976). Os dois companheiros viajantes de Wim Wenders cruzavam o país como forma de expor uma realidade social decrépita, enquanto o diretor Alexander Payne utiliza o road movie como ferramenta estilística para evidenciar a viagem interna de um pai, tentando suturar as feridas abertas em seu passado, acompanhado de seu filho caçula e uma simples propaganda promocional enviada pelo correio.

A beleza maior nesse filme minimalista está na insinuação de que o velho cansado, disposto a caminhar uma absurdamente longa distância para requisitar seu prêmio, talvez seja o único com plena consciência de que não há tesouro algum no final da jornada. Ele também sabe que seu filho mais velho intenciona colocá-lo em um asilo. Todos os abutres que encontra ao revisitar seu passado, incluindo membros de sua própria família, aglomeram sobre o frágil homem com sorrisos falsos, desejando apenas uma fatia generosa desse bolo. Todos chegam a crer na possibilidade milionária em algum ponto dessa longa estrada até Nebraska, e o silencioso protagonista interpretado por Bruce Dern (Woody) está disposto a não quebrar a ilusão, pois após décadas de desgastante rotina, ele está sendo notado, até mesmo aplaudido.

A cena em que ele busca sua dentadura nos trilhos do trem, com o filho, serve como demonstração de sua lucidez ácida. Em seu rosto aparentemente frio na cena do videokê, podemos notar o choque por constatar a falsidade daquelas pessoas, ainda que o roteiro, ótimo trabalho minimalista de Bob Nelson, nos estimule a ver sua reação impulsiva conectada à emoção de estar sendo reconhecido. As canções selecionadas, nunca por acaso, potencializam a crítica comportamental: “Time after time”, “In the ghetto” (a letra com mais consciência social, ironicamente entregue àquele que menos a personifica na trama) e “Green, green grass of home” (a realidade que o homem encontra é a perfeita antítese da letra que incita a nostalgia do antigo lar).

Uma grata surpresa é o senso de humor eficiente que permeia o filme, personagens hilários como a mãe desbocada, aniquilando em poucos minutos a forte impressão de que seria uma experiência profundamente sorumbática. 

Nenhum comentário:

Postar um comentário