quarta-feira, 17 de setembro de 2014

"Depois de Lúcia", de Michel Franco


Depois de Lúcia (Después de Lucía - 2012)
Como alguém que já sofreu na adolescência com estes atos de violência física e psicológica, afirmo que nunca assisti uma obra que retrate tão fielmente a angústia que envolve o "bullying". Normalmente utilizado pelas lentes do cinema como ferramenta de humor, com o valentão intimidando o nerd, amenizando com absurdos estereótipos uma prática muito comum, que ocorre em todas as escolas. Violência nascida de um desvio de caráter, levando aquele adolescente a continuar praticando este tipo de intimidação pelo resto da vida, em trotes universitários, brigas nos campos de futebol ou em discussões no trânsito, por exemplo.

O diretor Michel Franco acerta ao evitar qualquer clichê ou melodrama, apostando no completo silêncio. A câmera quase sempre estática acentua a imersão do público, obrigado a focar sua atenção por vezes em eventos que ocorrem quase fora do enquadramento. Não há alívios cômicos, a, por vezes, insuportável tensão é mantida do início ao fim. A jovem Alejandra está emocionalmente abalada com a morte de sua mãe, a Lúcia do título, e sente seu pai cada vez mais distante, o que acaba deixando-a vulnerável no ambiente social em que passa grande parte de seu tempo: a escola. A divulgação de um vídeo dela em um momento íntimo promove uma perseguição hipócrita, pois aqueles mesmos jovens, como se mostra em uma cena, não viam mal algum em expor suas aventuras sexuais. Evitando passar para seu perturbado pai mais um problema, ela corajosamente suporta sozinha todas as provações diárias. Aquele que não é violento, não costuma saber lidar instintivamente com a violência. O terceiro ato é radicalmente diferente, em ritmo e tom, entregando um desfecho extremamente satisfatório, evidenciando ainda mais a clara inspiração nos trabalhos de Michael Haneke, ainda que ideologicamente incoerente em sua catarse.

A intenção óbvia é causar com seu indefensável impacto, uma necessária reflexão. O que leva um jovem a buscar humilhar um colega que nada lhe fez? Quais as razões por trás da cumplicidade silenciosa daqueles que testemunham estes atos? Qual a influência dos pais neste processo? Perguntas que o roteiro nos direciona, aguardando uma resposta em nossas consciências. Filme obrigatório!

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