quinta-feira, 6 de março de 2014

"The Voice" em Hollywood


Frank Sinatra começou em Hollywood utilizando sua imensa popularidade como crooner da orquestra de Tommy Dorsey, na década de quarenta, em produções modestas (chanchadas) dos estúdios RKO, como “Noites de Rumba” (1941) e “Barulho a Bordo” (1942). Após afastar-se da orquestra e iniciar seu trabalho solo, continuou buscando aperfeiçoar-se como ator. Vale destacar nesse período inicial a sua participação no musical: “Quando as Nuvens Passam” (1946), cantando a emocionante “Ol´ Man River” de Jerome Kern e Oscar Hammerstein. O primeiro filme em que teve a oportunidade de construir um personagem foi o divertido musical “Marujos do Amor” (1945), onde fazia dupla com Gene Kelly. Seguindo o mesmo molde, vieram produções que se alternavam entre o tolo/divertido (caso de “A Bela Ditadora”) e o medíocre/embaraçoso (caso de “Beijou-me um Bandido”). A obra que simbolizaria essa época: “Um Dia em Nova York” (1949), ainda mantém certo charme, mas talvez tenha sido, dentre os filmes dirigidos por Stanley Donen em sua fase inicial, aquele que envelheceu pior. Musicalmente, o final da década de quarenta estava sendo desolador para o cantor, que via suas canções despencando nas paradas de sucesso. Muitos acreditavam que sua carreira estava acabada.

A década de cinquenta representou o período em que Sinatra ressurgiu, demonstrando extrema ousadia e coragem. Diferente de Elvis Presley, que tinha um empresário ganancioso que limitava suas escolhas cinematográficas a produções sem ambição, veículos para sua carreira musical, Sinatra estava livre para decidir seu rumo na indústria. Em “Double Dynamite” (1951), contracenava com Jane Russel e Groucho Marx. Na gema noir esquecida “Meet Danny Wilson” (1952), ele interpreta um personagem quase autobiográfico. No ano seguinte, como coadjuvante no belo “A Um Passo da Eternidade” (From Here to Eternity), recebeu um Oscar (entre os concorrentes, estava Jack Palance) e tornou-se novamente interessante para os produtores, que voltaram a apostar em seu nome nos letreiros luminosos. Em “Meu Ofício é Matar” (Suddenly – 1954) ele realiza aquela que considero sua melhor interpretação: um sociopata que decide assassinar o presidente dos Estados Unidos, atirando de uma janela com um fuzil de precisão. Quando o presidente Kennedy foi vítima de algo similar anos depois, o cantor demonstraria seu arrependimento por ter participado da obra (existe um boato mentiroso, que afirma que ele teria impedido a exibição posterior do filme), que o assassino Lee Harvey Oswald afirmou ter assistido um dia antes de cometer o crime. O único vilão que Sinatra interpretou no cinema, numa caracterização ambígua e corajosa que apontava seu interesse em expandir os horizontes de sua carreira como ator, infelizmente perdida em meio a uma corrente de infortúnios. Após alguns musicais ingênuos, ele novamente viria a demonstrar seu talento em “O Homem do Braço de Ouro” (1955), dirigido pelo genial Otto Preminger. Como um viciado em heroína, recebeu sua segunda indicação ao Oscar, mas dessa vez o felizardo foi Ernest Borgnine, por “Marty”. O filme possui vários problemas no roteiro (personagens secundários pifiamente construídos, por exemplo), mas a atuação de Frank é impecável. Brincadeiras refinadas como “Alta Sociedade”, em que contracenava com Bing Crosby e Grace Kelly, e “Meus Dois Carinhos” ancoravam-se numa fórmula de sucesso, mas somente administravam a persona do cantor, nunca a aprimoravam. No final da década ele começou a incluir seus amigos, que formavam a sociedade informal popularmente conhecida como “Rat Pack”, em suas produções, como Dean Martin e Shirley MacLaine em “Deus Sabe Quanto Amei” e Peter Lawford em “Quando Explodem as Paixões”.

“Onze Homens e Um Segredo” (Ocean´s Eleven – 1960) é o símbolo da parceria entre os membros do “Rat Pack”, que incluía Sammy Davis Jr. e Joey Bishop. Entre momentos bem engendrados, como o último ato, e outros menos inspirados, o que mantém o charme da produção é o clima de camaradagem que exala em cada cena. Os anos seguintes foram de experimentação para o astro, que chegou a dirigir (e estrelar) o bom filme de guerra: “Ninguém foi Tão Valente” (1965). Chegou a contracenar com medalhões como Spencer Tracy (no fraco “A Hora do Diabo”) e Lee J. Cobb (no mais fraco ainda “Come Blow Your Horn”). Enquanto considero o já citado “Meu Ofício é Matar” como sua melhor interpretação, “Sob o Domínio do Mal” (The Manchurian Candidate – 1962) é seu melhor filme. Dirigido por John Frankenheimer, Sinatra novamente tocou em um tema espinhoso, vivendo um herói militar que retorna para casa após a guerra, somente para perceber que foi usado em uma trama de espionagem, onde por meio de hipnose foi levado a assassinar até mesmo membros de seu próprio pelotão. Na segunda metade da década de sessenta, protagonizou alguns bons filmes de suspense, como “Tony Rome” e “The Detective”. Ele retornou de forma elegante após longos anos no fraco drama “The First Deadly Sin” (1980), onde contracenava com a bela Faye Dunaway.

Sinatra será sempre lembrado por sua brilhante carreira musical, poucos realmente dão o valor merecido à sua carreira cinematográfica, que é rica. Ele vivia depreciando seus méritos como ator, mas basta um olhar atento ao seu conjunto de obra para notarmos que, em sua versatilidade, ele abraçava personagens dos mais variados, sempre entregando algo correto e elegante.

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