sábado, 22 de março de 2014

O politicamente incorreto

Qual a função do escapismo? Fazer-nos crer que é possível voar, saltar prédios com um simples impulso, atravessar paredes com o poder da mente e entrar sozinho nas selvas vietnamitas com uma metralhadora, vencendo uma guerra. O que ocorre quando inserimos neste contexto o criminoso “politicamente correto”? Destruímos o necessário escapismo, formando jovens que, sem válvulas de escape criativas, irão buscar maneiras de extravasar a violência (inerente ao ser humano, que ao invés de negá-la deve discipliná-la). Ao contrário do que muitos mal-intencionados discursam, o crescimento do nefasto “politicamente correto” irá legar ao futuro pessoas muito mais violentas, pois sem nunca terem pisado descalças o chão arenoso da vida, perceberão um dia estarem completamente despreparadas para tal.

A razão que me faz abordar este tema nasceu da triste contemplação dos mecanismos que regem a programação da TV aberta. Cresci assistindo ótimos filmes de ação (como “Rambo” e “Comando para Matar”) na “Sessão da Tarde” global, os clássicos do horror (como “Fome Animal” e “Re-Animator”) no “Cine Trash” (apresentado pelo “Zé do Caixão”) da Band, aquelas comédias sensuais (“O Último Americano Virgem”, “Loverboy” e “Primavera na Pele”) que passavam no “Cinema em Casa” do SBT. Hoje em dia nossos pré-adolescentes são servidos com uma seleção digna daqueles assépticos e apocalípticos contos de Ray Bradbury, onde a sociedade do futuro mostra-se regida por incompetentes, para a criação de uma geração inapta, incapaz de contra-argumentar os desmandos de seus comandantes. Somos como uma variação de Alex De Large (de “Laranja Mecânica”), que exposto a uma programação extremamente violenta e incapaz de parar de assistir, pois lhe é negado fechar os olhos, passa a associar as ações violentas com a dor que provocam. Este tratamento torna-o incapaz de realizar qualquer ato violento, nem mesmo em defesa própria, tornando-se um “zumbi” manipulável e fraco. Diferente da genial criação de Anthony Burgess, nós estamos sendo diariamente expostos a uma programação ilusoriamente inofensiva, que elimina qualquer senso criativo (pois não oferece o “bem” e o “mal”, tornando impossível diferenciá-los), que formará em longo prazo uma sociedade perigosamente frágil.

Atendo-me a um exemplo muito simples, pensem em um daqueles sacos de areia que os pugilistas usam em seus treinos. Imaginem-se no mais revoltante acesso de fúria, naquele dia em que tudo deu errado. Caso você tenha à sua frente um destes sacos de areia, o que você faria? Descarregaria toda sua raiva nele, assim como muitos adolescentes em seus videogames, jogando “Street Fighter”, e depois de alguns minutos estaria tranquilo e pronto para o próximo “round” da vida. Sem este “saco de areia”, a pessoa acaba brigando com seus parentes, “chutando seu cachorro” e xingando os motoristas no trânsito. Eliminar algo que é natural no ser humano, acaba por acentuar exatamente o que se deseja destruir. Retire do adolescente todas as formas de escapismo (videogames, filmes, livros, músicas etc.) e você estará formando um adulto violento (pois o sentimento brota da pior forma: após décadas sendo negado) e psicologicamente fraco.

Lutem contra o politicamente correto, não permitam que seus filhos sejam manipulados no futuro. Quem se favorece com este panorama vergonhoso? Aqueles que vendem valores simplistas, como as religiões, onde não existem “tons de cinza”, somente “Deus” e o “Diabo”. Caso sigamos desta maneira, continuaremos sendo um país rico em igrejas evangélicas, políticos corruptos e analfabetos funcionais. Uma nação onde não formamos cientistas ou incentivamos o incessante questionamento. Uma pátria vergonhosamente sem um prêmio Nobel. Portugal tem quatro, a Alemanha tem 102, o Reino Unido tem 116 e os Estados Unidos têm 331. Na América Latina, a Guatemala, Costa Rica, Colômbia e Peru já receberam. O Chile tem dois. O México tem três. Argentina tem dois da Paz, um de Medicina e um de Química. Investimos menos em saúde que a média dos países africanos. Vocês realmente acreditam que um governo que trata com desleixo a saúde e a educação, realmente se preocupa com o que seus filhos estão assistindo na televisão? Acorde, preguiçoso povo brasileiro. Estão preparando o gado para o abate e vocês nem percebem. Viva o politicamente incorreto.

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