quinta-feira, 23 de abril de 2015

Faces do Medo - "Não se Deve Profanar o Sono dos Mortos"

Link para os textos do especial:


Não se Deve Profanar o Sono dos Mortos (Non si deve profanare il sonno dei morti – 1974)
Conhecida também pelo absurdo título “Zumbi 3”, essa produção ítalo-espanhola dirigida por Jorge Grau, quatro anos antes do “Despertar dos Mortos”, de George Romero, tem a mesma pegada de crítica sociopolítica de “A Noite dos Mortos-Vivos”, com os abusos da ditadura franquista simbolizados na figura de autoridade estupidamente truculenta, o personagem do inspetor, uma caricatura asquerosa. A trama não tem pressa de satisfazer o desejo imediatista pelo gore, o primeiro ato é basicamente dedicado à construção de suspense, porém, quando os ataques iniciam, você consegue perceber claramente uma fonte que matou a sede de, entre outros, Lucio Fulci, com seu “Terror nas Trevas”.

O retrato da sociedade, como exibido nas cenas iniciais, salienta um aspecto que agrega maior relevância ao filme, um cenário devastado pela poluição, o resultado de décadas de irresponsabilidade. Os heróis da resistência, desajustados, um hippie motoqueiro, uma jovem drogada e sua irmã desequilibrada, que, comparados ao tradicionalismo representado pelos policiais fascistas, são o elemento caótico necessário para que alguma ordem se estabeleça. Os alienados não são os zumbis, na metáfora usual do gênero, mas, sim, os tidos normais, aqueles que contribuíram, com o comodismo preguiçoso dos inconsequentes, para a degradação da sociedade. Como forma de evidenciar essa superioridade, o zumbi possui força física suficiente para dominar o vivo, além de manter, em sua aparência, grande similaridade.

A maquiagem de Giannetto De Rossi faz com que eles se pareçam com vivos desorientados, com olhos vermelhos, como homenageado no “Extermínio”, de Danny Boyle, ao invés de corpos em estado de decomposição. Enquanto Romero apontaria o dedo para o consumismo, Grau ousa sinalizar para a irresponsabilidade do homem com o meio ambiente, colocando a culpa do apocalipse zumbi em um recurso experimental para deter uma praga agrícola. Essa modificação feita pelo diretor no roteiro original, onde essa máquina era algo saído do universo da ficção-científica, ajudou a obra a continuar tematicamente relevante nos dias de hoje, não apenas como a primeira a ousar pisar o mesmo terreno do emblemático clássico de Romero. E, acho válido salientar, a meu ver, o aspecto mais aterrorizante: o som gutural emitido pelos zumbis, incorporado na trilha sonora. 

* O filme está sendo lançado em DVD, pela distribuidora "Versátil", na caixa "Zumbis no Cinema", contendo ainda, além de extras, "A Noite dos Mortos-Vivos", "A Noite dos Arrepios" e "A Noite do Terror Cego". Imperdível para os fãs do gênero.

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