O tipo de humor realizado pelo grupo Monty Python está acima
de qualquer avaliação comum, essencialmente anárquico e revolucionário, um
oásis abundante e atemporal em um deserto de ideias preguiçosas em seu gênero. Eric
Idle, Graham Chapman, Michael Palin, Terry Jones, John Cleese e Terry Gilliam
foram os responsáveis por essa incrível bagunça organizada que era veiculada na
série “Monty Python Flying Circus”, entre os anos de 1969 e 1974.
Tentemos imaginar o choque que o episódio de estreia da
primeira temporada causou no público britânico que o assistia. Antes mesmo da
abertura, Michael Palin aparecia vestido como um eremita e dizia apenas: “It´s...”, sendo seguido de forma retumbante pelos créditos iniciais, em forma de
animação criada por Terry Gilliam. Logo depois vemos Mozart como o personagem
principal de uma hilária cena, que conduzia a algo completamente fora de
sintonia com o que vinha sendo apresentado até então, dando passagem para um
tópico sobre a melhor piada do mundo, onde a irreverência do grupo atinge seu
ápice, para terminar com mais uma aparição do eremita que simplesmente não diz
a que veio. Isso sem falar nas interrupções de cenas pela metade, antes da
piada ser finalizada, para a entrada de outro segmento, aparentemente sem
nenhuma relação com o anterior, mas que no último instante surpreende o incauto
espectador com a entrada em cena do caricato Mozart que iniciou o episódio. A
liberdade criativa do grupo era revigorante ao se despir de qualquer senso
moralista, mandando o politicamente correto às favas. Todos os episódios das duas primeiras temporadas mantiveram o nível de qualidade, outra coisa rara no humor realizado até hoje.
Logo, a Sétima Arte utilizaria seus talentos em obras de importância
fundamental para o gênero.
O primeiro projeto intitulado “Monty Python em Busca do
Cálice Sagrado” (Monty Python and the Holy Grail -1975) se passa durante a Idade Média e acompanha as aventuras
do Rei Arthur e seus Cavaleiros da Távola Redonda em uma busca incessante pelo
Santo Graal. Na realidade, o contexto é apenas uma desculpa para o grupo
demolir cada convenção já criada sobre o tema, inserindo detalhes curiosos
sobre a velocidade de uma andorinha em voo, desvendando verdades sobre o famoso
Sir Robin, o “não-tão-bravo-quanto-Sir-Lancelot” e demonstrando a tenacidade do
Cavaleiro Negro que se manteve na luta mesmo após ver seus braços e pernas
decepados. O segundo projeto intitulado “A Vida de Brian” (Life of Brian - 1979) é o meu
favorito, foi como conheci o grupo nos meus tempos de pré-adolescente, apresentado em uma sessão matinal, pasmem, por um ótimo professor de História em um colégio de freiras. A obra tem a ousadia de fazer graça em cima de temas sagrados. Brian nasceu
na Judeia no mesmo dia que Jesus Cristo, porém na manjedoura ao lado. Ele é
tido como um messias e luta contra esta fama repentina, fugindo de seus fiéis
que o perseguem pela cidade. Dentre as muitas sequências impagáveis, destaco o
encontro entre Brian (Graham Chapman) e um Pilatos de língua presa, o que encaminha a cena para
inúmeras gargalhadas dentro e fora do roteiro. O final é um espetacular símbolo
do humor do grupo: crucificado, o jovem angustiado testemunha uma corajosa
tentativa de resgate perpetrada pelo Esquadrão Suicida dos Judeus. Ao
final, só lhe resta cantar preso à cruz: “Sempre olhe para o lado bom da vida”, com direito
a coreografia. Em 1983 o grupo realizou “O Sentido da Vida” (The Meaning of Life), um conjunto de cenas
burlescas ao extremo e que tentam explicar, ao estilo Python, qual seria a
razão de nossa existência. Mesmo sendo levemente inferior aos outros filmes, contém
sequências fabulosas, como a celebração musical onde um católico explica aos
seus inúmeros filhos porque terá que doá-los para experiências científicas, já
que o Vaticano proíbe os métodos anticoncepcionais e ele ficou sem dinheiro
para sustentar sua prole, cantando a sutil: “Todo Esperma é Sagrado”.
Sinceramente, odeio a expressão comumente utilizada: “Um
humor que não é para todos” (assim como sua parente próxima: “esse filme não é para todos”).
Acredito que não existe tal coisa, mas sim a comédia bem realizada e
a comédia mal realizada. O Monty Python conduzia com extrema
competência seu trabalho e aqueles que não se sentirem confortáveis com seu
humor, devem procurar e encontrar no reflexo do espelho as razões que os impedem. Aos que
ainda não conhecem o trabalho anárquico do grupo, fica a sugestão: O que estão
esperando? A “Inquisição Espanhola”?
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