O ator Morgan Freeman tempos atrás deu uma declaração
inteligente ao ser abordado sobre racismo. Quando perguntado sobre a melhor
forma de confrontá-lo, respondeu sem titubear: “não o mencione”. Ele também
afirmou que considera ridículo o conceito por trás de um “Mês da Consciência
Negra”, pois com sua existência apenas salienta o preconceito. Não existe “Mês
da Consciência Branca” ou um “Mês da Consciência Judaica”, então qual a razão
de resumir toda a importância dos negros na fundação dos Estados Unidos em
apenas um mês? Psicologicamente tendemos a conferir homenagens simbólicas ao
que consideramos diferente, posto que o que consideramos natural, nós
simplesmente absorvemos em nossa rotina.
O “Dia do Índio” e o “Dia Mundial do Orgulho Gay” existem,
ainda que a violência e o desrespeito contra índios e homossexuais continuem
sendo exercidos com a mesma contundência em nossa sociedade. O racismo é um
preconceito que nasce, como todos, da ignorância, tendo como base o discurso de
que negros são diferentes de brancos. Nos restaurantes do sul dos
Estados Unidos, na década de cinquenta, eram separadas as mesas para brancos e
as mesas para negros, banheiros para negros e banheiros para brancos. Quando reforçamos
a equivocada diferença, por meio de datas ou favorecimentos
especiais, posicionamos um tijolo a mais no muro da segregação. A única forma
de acabar com o racismo é eliminar qualquer tipo de hipócrita diferenciação, ou
como Morgan Freeman muito bem opinou, parando de falar no assunto. Infelizmente
este erro muitas vezes é cometido pelos próprios negros, que salientam a
diferença, ao invés de defenderem o fato de que somos todos iguais. Aquele que
veste uma camiseta com dizeres que afirmam algum senso exagerado de orgulho
negro, inconscientemente está agindo ideologicamente de forma tão
extremista, não tão violenta, quanto um neonazista. O racismo foi alimentado
por décadas pela diferenciação, então a única forma de erradicá-lo é alimentar
a igualdade.
Continuando no tema, quando Quentin Tarantino lançou seu faroeste “Django Livre” (Django Unchained), que tem como herói um
escravo negro (vivido por Jamie Foxx), ele foi alvo de diversas
críticas que acusaram o filme de racista. O diretor negro Spike Lee defendeu o
tolo argumento: “não vi, não verei e não gostei”. Lee fez carreira salientando
as diferenças, um tipo de blaxploitation panfletário, enquanto Tarantino
brinca com o senso de igualdade (entre gêneros cinematográficos, principalmente),
resumindo seu projeto a um conto de vingança com referências ao Western
Spaghetti italiano. Em um ponto de vista de extrema liberdade criativa,
fico pensando se, diferente de Tarantino, Lee se preocupa com a erradicação do
racismo, pois não teria mais pelo que lutar/lucrar. Assim como os programas de
televisão vespertinos que se nutrem da violência, que torcem para que o incêndio se
alastre, para que a audiência aumente. Infelizmente esta reação apatetada de
Lee acabou validando outros esforços similares, como os protestos que acabaram
causando a interrupção da fabricação de bonecos com personagens do filme. O
argumento utilizado foi o de que esses bonecos são altamente ofensivos aos
ancestrais dos negros e à comunidade afro-americana. No ponto de vista dos que
reclamaram, os bonecos representariam uma zombaria à escravidão. O real
achincalhamento reside no ato de fingir não ver, desviar o olhar da realidade
para uma ilusória bolha de proteção, cuja camada frágil não resiste sequer à
gota da chuva.
Retirem das prateleiras os bonecos dos negros heróis do
Velho Oeste, infelizmente ainda raros, deixando espaço para os usuais bonecos
de cowboys e super-heróis brancos. Rejeitando a mescla de brancos e
negros, inclusive nas lojas de brinquedo, com a desculpa de que se busca
preservar a história dos negros, os grupos reclamantes parecem demonstrar
preferência pela sustentação da diferença, como se a consequência dela fosse mais interessante para eles que os esforços por se homogeneizarem. O racismo
será uma palavra extinta quando, tanto brancos quanto negros, perceberem que
ela simboliza uma diferença inexistente.
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