Ensaio de Orquestra (Prova
d'Orchestra – 1978)
Dentre todas as analogias propostas por Federico Fellini em
sua carreira, nenhuma foi tão direta e simples. Sua pouca duração acentua a
feroz crítica social que o diretor cria, ao tentar compor um micro universo que
reflita com clareza o macro universo em que vivemos. O cenário escolhido foi
uma decrépita capela onde repousam túmulos centenários. A morte contracena com
a vida o afinar dos instrumentos.
Com a chegada dos músicos, começamos a distinguir atitudes
familiares. Aqueles mais sisudos, que levam com extrema seriedade sua profissão
se misturam aos brincalhões e aos rebeldes. Nós somos representados pela câmera
de uma equipe de televisão que registra o ensaio. Ao serem entrevistados, cada
profissional salienta a importância essencial de seu instrumento. A exuberante
pianista chega a afirmar com orgulho que o piano é superior porque não sai de
seu lugar, ela é quem precisa se aproximar dele e tocá-lo. Já um músico obeso
esquecido num canto diz que sua tuba é um instrumento solitário. Cada um
naquele recinto se sente o protagonista da orquestra.
A primeira meia hora de filme demonstra o que o diretor
italiano sabia fazer melhor: caricaturas perfeitas e com traços rápidos de
elementos da sociedade. Como toda caricatura, sempre exageradas, mas com muito
humor. Com a chegada do maestro e sua atitude autoritária, inicia-se um
movimento de rebelião que encontra seu ápice numa apoteose lúdica e fantástica,
envolvendo poeira, suor e lágrimas. Nas palavras do diretor: “uma parábola
ética para provocar certa vergonha no povo, para mostrar que a loucura
desorganizada das pessoas pode provocar a loucura organizada do Estado, a
ditadura".
A pequena obra fala acima de tudo, sobre a necessidade
humana de sobrepor o indivíduo ao coletivo. Afinal, como um personagem deixa
claro logo no início: todos nós tocamos nossos instrumentos apenas para nos
deleitarmos com a aranha, que no teto se balança em sua teia.
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