Os fãs costumam desprezar esse filme, como sendo o
responsável por destruir a carreira de Elvis no cinema, já que seu sucesso
avassalador nas bilheterias mostrou que o público estava disposto a pagar
várias vezes para ver o ídolo em musicais leves. O Havaí e o cantor acabaram
se tornando sinônimos na cultura pop. Quando os filmes dele começaram a perder
público, não pensaram duas vezes, colocaram o astro novamente nesse cenário,
achando que a mágica se repetiria. Visto fora desse contexto, não dá pra negar
que é um trabalho tremendamente satisfatório, verdadeiramente encantador.
Feitiço Havaiano (Blue Hawaii – 1961)
Após prestar o serviço militar, um jovem (Elvis Presley)
volta para a casa dos pais em Honolulu, no Havaí, e começa, contra a vontade
deles, a trabalhar em uma agência de turismo.
Enquanto as músicas de seus filmes anteriores eram compostas
por ótimos profissionais, a trilha sonora desse projeto já começava a refletir
certo desleixo, com alguns pontos altos, como o resgate de ótimas canções
temáticas havaianas (“Blue Hawaii” havia sido cantada por Bing Crosby em um de
seus filmes da década de trinta, “Aloha Oe” foi composta em 1878 por uma
princesa havaiana no exílio, “Hawaiian Wedding Song” é uma adaptação de “Ke
Kali Nei Au”, composta em 1926 para a opereta “Prince of Hawaii”), um pop já
bastante diluído nas agitadas “Rock-A-Hula Baby” e “Slicin’ Sand”, um sample da
tradicional canção infantil francesa “Alouette” em “Almost Always True”, uma
versão para o clássico espanhol “La Paloma”, que se tornou “No More”, e a
excelente “Can’t Help Falling in Love”, adaptada da francesa “Plaisir d’Amour”,
balada que se tornaria um símbolo na carreira do cantor, que sempre finalizava
seus shows com ela. A cena, uma das mais emblemáticas na cinematografia de
Elvis, mostra o jovem presenteando a avó da namorada com uma caixinha de
música. Mantendo a qualidade, sobra espaço na trilha para agradáveis temas
inofensivos, como “Ku-U-I-Po”, “Moonlight Swim”, “Hawaiian Sunset”, “Island of
Love”, “Beach Boy Blues” e a desprezível “Ito Eats”, um vislumbre do tipo de
bobagem embaraçosa que ele seria obrigado a defender em filmes posteriores. Não
há sequer um legítimo Rock and Roll. Todo o disco foi gravado em duas noites
intensas.
Juliet Prowse, a dançarina de “Saudades de Um Pracinha”,
havia sido escalada para coprotagonizar a obra, mas ela desistiu algumas
semanas antes do início das filmagens, sendo então substituída por Joan
Blackman, uma bela morena de olhos verdes que repetiria sua parceria com
Presley em “Talhado para Campeão”. Ela vive uma personagem que sofre com o
assédio feminino sobre seu namorado, um rapaz recém-saído do exército e que
deseja usufruir das belezas naturais do Havaí, mantendo-se o mais afastado
possível das pouco estimulantes responsabilidades profissionais incentivadas
por sua mãe neurótica, vivida por Angela Lansbury, num momento caricato hilário.
Tornar-se um funcionário na “Companhia Sulista de Frutas Havaianas” da família
é viver das glórias de outros, acomodar-se na sombra projetada pelos vários
anos de trabalho de seu pai.
Chad Gates quer vencer por si próprio, fazendo o que gosta.
Qual adolescente não se identificaria com esse dilema? O roteiro é simples e
objetivo, com espaço suficiente para a inclusão de várias canções que funcionam
muito bem em seus contextos, algo que se tornaria cada vez mais difícil de alcançar
nos filmes que o cantor fez pós-1965. A direção do experiente Norman Taurog, que
iniciou carreira na década de vinte e, com Elvis, fez parceria em nove filmes,
soube utilizar bem o carisma do protagonista, colocando-o em situações onde
pôde demonstrar seu senso de humor, ainda que nunca em cenas que representassem
qualquer desafio. Ainda é perceptível a preocupação com as coreografias das
sequências musicais, com destaque para a dança na praia, ao som de “Slicin’
Sand”, um momento genuinamente empolgante.
O seu personagem no musical “Saudades de Um Pracinha” tinha
características de personalidade interessantes, ele era um mulherengo meio
trapaceiro, mas em “Feitiço Havaiano” temos a criação do personagem padrão: o bom
moço que canta nas horas vagas, um tipo que ele repetiria, com raras exceções,
até seu último filme. A alquimia estava completa, a indústria havia conseguido
em tempo recorde, de roqueiro rebelde e perigoso a uma asséptica variação de
Rodolfo Valentino. Em uma das cenas mais lembradas, outro sintoma da
transformação, Chad dá palmadas morais no traseiro de uma garota rebelde. De
contestador do sistema a guardião dos bons costumes.
A Seguir: “Em Cada Sonho Um Amor” (Follow That Dream)
Ótimo comentário sobre os filmes com o rei Elvis Presley; Nós fãs, só podemos agradecer por incluir seus filmes em sua lista. Grata, adorei. Abraços
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