quinta-feira, 30 de outubro de 2014

"Os Mercenários 3", de Patrick Hughes


Os Mercenários 3 (The Expendables 3 - 2014)
A computação gráfica é fraca, sim, faz parecer por vezes que estamos assistindo um filme de ação da década de noventa. É óbvia a utilização de tela verde nas cenas em que os personagens interagem dentro de automóveis. Mas essa não seria exatamente parte da proposta nostálgica do projeto, cujo público alvo principal é o adulto que cresceu assistindo esse entretenimento americano simbólico da era Reagan na década de oitenta e noventa? O que importa é se o resultado diverte e se consegue se conectar emocionalmente com aquela criança interna que brincava com a bandana vermelha do Rambo na cabeça. Criticar possíveis falhas num roteiro que é estruturado como uma celebração das mesmas cometidas outrora, não apenas é uma estratégia equivocada, como também uma declaração pública de insuportável chatice. Queremos uma overdose de frases de efeito, metralhadoras disparadas apoiadas na cintura, demonstrações de camaradagem estapafúrdias, clichês desgastados, momentos melodramáticos que são resolvidos com a aproximação da câmera em olhares de ódio que prometem vingança, tudo isso faz parte da tremenda brincadeira. E é isso que Stallone entrega ao público, pela terceira vez, com a mesma competência. 

Analisando friamente o conjunto da obra, esse pode ser até o resultado mais recompensador da franquia, graças ao vilão vivido por Mel Gibson, o primeiro que realmente vende bem o conceito da ameaça. Eric Roberts e Van Damme eram canastrões interpretando caricaturas, mas Gibson é um excelente ator, outro nível. Até mesmo as limitações da classificação etária contribuíram para que o humor, elemento de grande importância no subgênero, soasse mais fluido, retirando um pouco os excessos típicos de grindhouse dos anteriores e assemelhando-se mais com a violência das revistas em quadrinhos. Não eram as mortes sangrentas que nos atraíam naqueles filmes, mas sim a personalidade daqueles que as cometiam. As referências visuais continuam eficientes e, felizmente, nada sutis, sobrando até para “Risco Total”, de Renny Harlin. Mas o que considero genial nessa proposta de resgate é a forma como Stallone sabe inserir o contexto real no seu universo fantasioso, interagindo assim diretamente com o público alvo, como quando colocou Chuck Norris para brincar com sua própria persona no anterior. 

A indústria pode ter virado as costas para Gibson, mas Sly corajosamente bate de frente e coloca-o em destaque como um frio e cruel traidor amargurado. Antonio Banderas fez sucesso recente em uma animação, então sua introdução é digna de um personagem de desenho animado, um alívio cômico que funciona muito bem. Wesley Snipes foi manchete durante anos nas páginas policiais e acabou de sair da prisão, nada mais coerente que apresentá-lo sendo libertado de uma, fazendo disso o espetáculo que inicia o filme. E como inserir Harrison Ford no projeto sem, mesmo que em um breve momento, fazer com que ele reviva Han Solo, antes de seu retorno oficial no próximo “Star Wars”? São esses detalhes que tornam a experiência saborosa, fazendo com que os defeitos não pesem tanto na balança. Jet Li incompreensivelmente não diz a que veio, a equipe jovem tem pouco carisma e é utilizada descaradamente apenas como artifício narrativo, mas, fora isso, eu não tenho do que reclamar. O filme é como o reencontro de uma turma escolar que marcou sua vida, uma festa despretensiosa na qual somos convidados a esquecer as mazelas do mundo real e, por duas horas, entrarmos novamente em contato com a criança interna que se camuflava com tinta guache nas brincadeiras de guerra com os vizinhos. 

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