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Somos o Que Somos (We Are What We Are - 2013)
Refilmagem americana do mexicano "Somos Lo Que Hay", de
2010, trazido para os cinemas brasileiros pela produtora DarkSide Books, em seu debut
cinematográfico. Na trama, uma reclusa família vê seus bizarros costumes
ameaçados quando uma chuva torrencial atinge sua cidade, o que força as irmãs
adolescentes Iris (Ambyr Childers) e Rose (Julia Garner) a assumir a
responsabilidade de defender os segredos da casa. E acredite, quanto menos você
souber sobre a trama, melhor será a experiência. O gênero caminha de forma trôpega nos últimos anos, com
poucos rompantes de criatividade, elemento essencial. Quando encontramos
uma obra que nos surpreende, apresentando-se a princípio de forma paciente,
tomando cada minuto na elaboração de algo que somente será entregue ao final
(exemplo clássico: O Bebê de Rosemary), precisamos aplaudir o esforço.
O usual recurso, na necessidade de manter a atenção dos mais
novos, de explodir sangue e vísceras nos olhos do público, acaba cansando,
anestesiando, limitando a capacidade do horror que reside na imaginação,
potencialmente mais terrível do que qualquer roteirista poderia imaginar. Ele
merece crédito por apostar no fator psicológico. O diretor Jim Mickle, responsável pelo bom filme
de vampiros: "Stake Land – Anoitecer Violento", de 2010, e o roteirista Nick
Damici se inspiram no que de melhor havia na imperfeita produção mexicana
dirigida por Jorge Michel Grau, superando-a em clima e nível das atuações, especialmente Bill Sage, como o patriarca da família. Trocar os filhos do original pelas duas meninas foi um toque
de gênio. Esse é um exemplo de refilmagem que é melhor que o original. A forma
como a trama trabalha o subtexto da alegoria bíblica, como a sutil referência a
Abraão e Isaque, reforçando o poder dos rituais e tradições que mantém um clã
unido, com foco no valor do sacrifício, sem se preocupar em “jogar migalhas”,
aqueles sustos artificiais que pululam na tela pra nos manter acordados em
filmes ruins do gênero.
A intenção clara é nos pegar pela mão, conduzindo-nos minuto
a minuto para dentro dessa situação assombrosa, até o momento em que percebemos
que não há escapatória. A imersão, algo tão desvalorizado no gênero atualmente,
pode ser tido como o maior mérito do filme. Outro ponto alto, que colabora na
execução dessa imersão, é a fotografia de Ryan Samul, que nos faz sentir
em um período de tempo alternativo, evocando ideias perturbadoras, sem a
necessidade de explicitá-las em imagens. O filme é um conto gótico elegante que nos
remete visualmente aos melhores exemplares da década de 70. É como um
passeio pela Deep Web, e o desfecho dificilmente vai sair da sua mente.
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