domingo, 20 de novembro de 2016

"Star Trek: Sem Fronteiras", de Justin Lin


Star Trek: Sem Fronteiras (Star Trek Beyond – 2016)
Ao analisar esses novos projetos da franquia, muito eficientes naquilo que se propõem a entregar, não dá pra negar que os três roteiros juntos não arranham a superfície de possibilidades que a criação de Gene Roddenberry representa para o gênero da ficção científica. Havia tolice, humor bobo e ação irrelevante na série clássica, mas até mesmo os episódios mais ingênuos terminavam incitando alguma reflexão interessante. Esse espírito foi captado nos melhores filmes com a tripulação original, tramas que equilibravam bem os aspectos mais leves da relação entre os personagens, com a reflexão que abusava de referências a várias vertentes artísticas e a necessidade mercadológica de se construir sequências empolgantes de ação. O mercado hoje, infelizmente, está bem diferente. 

Os adolescentes são o público-alvo da indústria, são eles que compram ingressos, facilmente manipulados em estratégias de marketing, respiram o hype como se não houvesse amanhã, imediatistas e, com raras exceções, com pouquíssimo senso crítico. Então é compreensível que a cena em que Magro (Karl Urban) faz um brinde desejando boa visão e uma cabeça com muito cabelo, teoricamente uma alusão à consciência da mortalidade, acabe soando forçada. A ideia é boa, funcionaria com um elenco mais velho, funcionava muito bem nos filmes antigos, ornava poeticamente com os cabelos grisalhos, mas a equipe da nova Enterprise não parece ter muito mais que trinta anos. A indústria precisa que os adolescentes se identifiquem com os heróis, então todos os personagens agem e falam como a garotada. As tiradas cômicas soariam confortáveis nas bocas de alunos do fundo da sala, o título poderia ser: a turma da bagunça no espaço. A estrutura é frenética, com pausas rápidas para que a trama avance um pouco, mas nada muito elaborado, pra que o adolescente na sessão não sinta vontade de checar seu smartphone. O resultado, ainda que divertido, frustra demais o público adulto que gosta de ser minimamente desafiado. A banalização da ação, especialmente da forma como o diretor Justin Lin a constrói, abusando de giros de câmera, anestesia os sentidos, nivela tudo como barulho irritantemente alto, as sutilezas são imperceptíveis, em suma, você escuta o show encostado na caixa de som. 

Quando a trama injeta homenagens a Leonard Nimoy, parece que pai do adolescente no comando tomou as rédeas, o filme se torna mais orgânico, mais real, sentimos a emoção sincera na entrega de Zachary Quinto, sentimos saudade quando ele encontra uma foto da tripulação em “Jornada nas Estrelas – A Terra Desconhecida”, nesses momentos eu consigo enxergar o potencial desperdiçado. Quando a nave foi destruída em “À Procura de Spock”, o mundo inteiro comentou, os fãs custaram a acreditar que os produtores tinham ousado tanto. Já em “Sem Fronteiras”, a nave é destruída, você mastiga a pipoca, ela é reconstruída em fast forward no desfecho, você toma o último gole de refrigerante, duas horas depois você nem se lembra da motivação do vilão. Krall (Idris Elba) visualmente é impactante, mas em essência não passa de um monstro dos Power Rangers. O terceiro ato tenta enriquecer a personalidade dele, mas a história é sufocada pelo barulho, com o Capitão Kirk (Chris Pine) se exibindo em peripécias que constrangeriam James Bond e Ethan Hunt. É impressionante como ainda não conseguiram resgatar o lado estrategista do personagem, ele se tornou um genérico herói de blockbuster. 

O conceito por trás do título original é engenhoso, a metáfora do “além” como jornada de autoexploração individual, com cada personagem principal sendo forçado a enfrentar seus conflitos internos e amadurecer, mas o roteiro de Simon Pegg e Doug Jung, por mais espirituoso que seja em seu tom cômico, não consegue estabelecer uma base sólida para que o conceito seja transmitido, não vai além de alguns preguiçosos diálogos expositivos. 

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