O Shaolin do Sertão (2016)
Quando Halder Gomes lançou “Cine Holliúdy”, eu enxerguei o
potencial não aproveitado, por mais que quisesse gostar do filme, algo em sua
estrutura técnica não facilitava nesse sentido. A evolução em “O Shaolin do
Sertão” é inegável, o tema abre mais possibilidades, o nível das atuações é
melhor, mas alguns problemas ainda são claramente visíveis. O humor popular
competente, com origem na tradição circense, remete aos filmes clássicos dos
Trapalhões, o que torna a simbologia da simpática presença de Dedé Santana
ainda mais forte. O roteiro de L.G. Bayão apenas peca na repetição exagerada de
algumas situações cômicas, algo que poderia ser resolvido na sala de edição. O
recurso da utilização de expressões do cearencês injeta identidade ao projeto, mas
também soa forçado em algumas cenas, piadas que praticamente imploram pela
risada do público, quando não há necessidade alguma, já que a trama é engraçada
naturalmente.
O conceito de um jovem padeiro nordestino apaixonado por filmes
de artes marciais que luta para ser reconhecido como um grande lutador é
encantador, resgata a nostalgia do cinema lúdico dos tempos do VHS ao ser
ambientado na década de oitenta, com a fotografia espertamente visualizando as
sequências de sonho com imagens riscadas e ghosting, simulando a reprodução das
fitas. E que tirada genial inserir o comediante e músico Falcão, uma das
figuras mais exóticas do cenário popular nacional, como um trambiqueiro que finge
ser um mestre shaolin. O ponto alto do filme é o treinamento para a grande
luta, com a montagem respeitando a fórmula tradicional que Hollywood consagrou,
mas subvertendo insanamente o conteúdo. Só as frases de sabedoria do mestre já
são mais engraçadas que comédias inteiras que o cinema nacional despeja
anualmente. Edmilson Filho domina as cenas de luta, mas consegue ser mais
eficiente ainda nos momentos cômicos, um carisma poderoso que, em uma sequência
hilária, alia a segurança técnica na exibição marcial com desenvoltos passos de
forró. O menino Piolho, vivido por Igor Jansen, demonstra incrível timing nas
piadas, um talento espontâneo, assim como a veterana Fafy Siqueira, que merecia
mais espaço no cinema nacional. É uma pena que nossa indústria desperdice
profissionais desse nível em produções fracamente roteirizadas e com curtíssimo
prazo de validade na televisão.
O combate final é longo, dando espaço para que a técnica
marcial coabite com o cativante humor circense, representado pelo juiz palhaço,
vivido por Tirulipa. A edição poderia ser menos generosa nessa sequência, mas o
resultado não prejudica a experiência. O carisma do protagonista já ganhou o
público, algo que é muito difícil de encontrar em produções nacionais
similares, normalmente defendidas por comediantes forçados que abusam de berros
e dinamismo gestual, quando a genialidade reside na sutileza, na naturalidade
transmitida em um texto de qualidade.
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