Cinco Bonecas Para a Lua de Agosto (5 bambole per la luna
d'agosto – 1970)
Um grupo de amigos é vítima de assassinatos misteriosos numa
ilha paradisíaca. Inspirado livremente em “O Caso dos Dez Negrinhos”, de Agatha
Christie.
Quando entrevistei o colega crítico norte-americano Tim
Lucas,
especialista na obra de Mario Bava, eu citei “Cinco Bonecas Para a Lua de
Agosto” como um dos meus favoritos em sua filmografia. A razão? O resultado me
fascina como uma mensagem criptografada, um enigma que parece se complicar mais
a cada revisão, um convite para variadas interpretações, um roteiro em que nada
se desenvolve de maneira previsível. Gosto de roteiros que continuam instigando
questionamentos dias após a sessão. O assassinato na sequência inicial,
respeitando a fórmula básica e facilmente identificável de cenas similares,
acaba se revelando uma farsa tola, estabelecendo o tom debochado. A bela
aparentemente indefesa, desgastada vítima dos gialli, pode se mostrar
experiente em artes marciais. A estrutura whodunnit, a própria característica
principal do gênero, a teatralidade sádica e estética dos assassinatos,
elemento essencial também do giallo, ocorre sempre fora do alcance da câmera, até
mesmo confrontos físicos menores entre personagens são atrapalhados por objetos
de cena que bloqueiam a visão do espectador.
O leitmotiv visual dos patéticos corpos
humanos dividindo espaço no freezer com pedaços de carne bovina, a trilha
sonora debochada de Piero Umiliani que remete às brincadeiras infantis, a
apatia dos sobreviventes que parecem aguardar tranquilos na ilha, conscientes
do fim trágico, metáfora criativa para a finitude, por trás do contexto raso
que envolve a ambição do assassino que deseja obter a fórmula de um cientista
em uma reunião de empresários, algo que nunca é devidamente explicado. Esse MacGuffin
frágil e pequeno, aquilo que desejamos entender a vida toda sem sucesso, o
sentido da existência, o enigma que nos entretém enquanto aguardamos na ilha
paradisíaca que esconde perigos em cada trecho de terra, enquanto traições
ocorrem e novos amores são despertados, som e fúria, até que acabemos
pendurados na inevitável câmara frigorífica, destituídos de qualquer falsa
importância social que tenhamos logrado conquistar no decorrer da experiência.
* O filme foi lançado em DVD pela distribuidora "Versátil", com a curadoria sempre impecável de Fernando Brito, na caixa "Giallo, Vol. 3", tendo como material extra uma apresentação em vídeo do próprio Fernando, que já ministrou cursos sobre a obra do cineasta italiano. A caixa contém ainda os seguintes títulos: "Premonição" (1977), "No Quarto Escuro de Satã" (1972) e "Os Passos" (1975).
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