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Na tentativa de manter sua mina de ouro trabalhando sem
parar, o Coronel Parker nem esperou ele voltar do exército, já havia fechado
contrato para duas produções nos estúdios Fox, as últimas que viriam a primar
pela elegância do material e pela qualidade técnica. Com o fracasso comercial desses
filmes com uma pegada mais séria, Elvis se veria forçado a repetir, durante boa
parte da década, variações de seu personagem cômico em “Saudades de Um Pracinha”.
O segundo faroeste, e o melhor, dos três em sua carreira, um roteiro que havia
sido pensado como veículo para Marlon Brando e Frank Sinatra, inicialmente
intitulado “Flaming Lance”, o título do livro original do respeitado autor do
gênero: Clair Huffaker, depois “Black Star”, até chegar ao meio-termo: “Flaming
Star”. A decisão foi de última hora, já que o cantor chegou a gravar a
canção-título em sua segunda versão.
Estrela de Fogo (Flaming Star – 1960)
Durante os anos que se seguiram à Guerra Civil dos Estados
Unidos, a região oeste do Texas era palco do encontro nada tranquilo entre duas
culturas: os brancos e os nativos. Pacer Burton (Elvis Presley), o filho de um
rancheiro branco (John McIntire) e de sua bela esposa da tribo Kiowa (Dolores
Del Rio). Quando a luta entre colonizadores e indígenas torna-se um fato, o
jovem se vê envolvido na brutal violência, apesar de seus esforços para
promover a paz.
Elvis estava inspirado nas filmagens, trabalhando nas horas
vagas em seu primeiro álbum gospel: “His Hand in Mine”, onde ele se
reencontrava com suas origens musicais e familiares. O roteirista Nunnally
Johnson, de “Vinhas da Ira”, e que viria a escrever o clássico popular “Os Doze
Condenados”, ficou responsável pela adaptação do livro de Huffaker e era a
primeira opção para a cadeira de direção. Outra curiosidade interessante, a
rainha do terror Barbara Steele, figura marcante em “A Maldição do Demônio”, de
Mario Bava, estava contratada para ser a namorada do cantor na trama, porém,
após um desentendimento com o diretor Don Siegel, que havia comandado o marco
do sci-fi: “Vampiros de Almas”, foi trocada por Barbara Eden, que, anos depois,
receberia fama internacional como a protagonista da série “Jeannie é Um Gênio”.
Siegel receberia maior atenção no início da década de setenta,
comandando “Dirty Harry”, com Clint Eastwood. A direção de fotografia ficou a
cargo de Charles G. Clarke, que havia trabalhado no musical “Carrossel”,
de 1956.
A trama trabalha de forma muito consciente a espinhosa questão
da miscigenação e, principalmente, os direitos dos índios, usualmente
retratados no cinema de maneira pejorativa, com uma abordagem que foge de
qualquer estereótipo, dez anos antes de “Pequeno Grande Homem”, com Dustin
Hoffman. Ao contrário de “Rastros de Ódio”, realizado quatro anos antes, por
exemplo, o racismo não é retratado como aberração de alguns indivíduos ou um
governo insensível, mas, sim, algo enraizado em toda uma cultura. É
interessante comparar essa corajosa conduta, para os padrões do início da
década de sessenta, com o filme que Elvis protagonizaria em 1968: “Joe é Muito
Vivo”, que impressiona por agir de maneira completamente antagônica, reforçando
todos os clichês em uma farsa bastante equivocada, que foi considerada ofensiva
pelos simpatizantes da causa indígena. Mas isso será tema de um texto posterior
no especial.
Uma preocupação compartilhada pelo diretor e, especialmente,
por Elvis, que desejava ser desafiado como ator, era referente às canções que
estavam programadas, algo em torno de dez, como estipulava o plano original do
empresário do cantor. Não havia coerência alguma em colocar o personagem,
inserido naquele drama familiar intenso, cantando um material que fosse
comercialmente válido. Então, após alguma luta com os executivos, o diretor
conseguiu amenizar o problema, limitando a uma canção que emoldurava os
créditos iniciais e outra bem breve e esquecível, “A Cane and a High Starched
Collar”, ambientada em uma festiva reunião familiar, nos primeiros cinco
minutos. Na cena, dá pra perceber a felicidade do cantor ao terminar aquele
interlúdio musical e se desfazer do violão, elemento totalmente alienígena no
cenário. Siegel, que, a princípio, tinha preconceito sobre o talento do
protagonista, não demorou a defender publicamente Elvis, afirmando que havia conhecido
poucos atores tão sensíveis e dedicados quanto ele. Em momentos como a forte cena
seguinte ao funeral da mãe, vivida por Dolores Del Rio, ou o trágico desfecho, podemos
enxergar o comprometimento dele no subtexto de sua atuação.
Esse ótimo filme, o tipo de trama socialmente relevante que
Elvis sonhava defender no cinema, sofreu com um péssimo timing e uma desastrosa
campanha de marketing que prometia um musical, lançado apenas quatro semanas
depois do bem-sucedido “Saudades de Um Pracinha”, que o cantor se arrependia de
ter feito, amargou o desinteresse do público, que procurava aquele mesmo clima
divertido e descompromissado. O próximo projeto, também resultado da luta dele
por melhores papéis, seria roteirizado pelo respeitado Clifford Odets, de “A Embriaguez
do Sucesso”.
A Seguir: “Coração Rebelde” (Wild in The Country)
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