quarta-feira, 13 de abril de 2016

A rasa discussão política


Não é bom falar sobre política, a incursão no tema, quando você atua em qualquer outra área, pode até prejudicar carreiras, arrumar inimizades. Esse é o conceito que aprendemos a seguir, ano após ano, eleição após eleição. Mas silenciar algo tão primordial em uma sociedade não seria uma forma fácil de nos eximirmos de qualquer responsabilidade sobre algo que depende exclusivamente de nossas ações conscientes? Uma característica mais representativa do medo do que da lucidez? E, analisando com maior atenção, não seria uma explicação plausível para compreendermos o problemático estado atual do sistema político? Nós devemos temer ou respeitar? São perguntas que deveriam fazer parte do inconsciente coletivo de um povo, não somente em época de eleição.

“Não fala sobre política, isso pode te complicar”, seria um parente próximo filosófico do terrível: “Se você soubesse como são feitas as linguiças, você não as comeria”? Esse medo de entender o processo democrático é o que afasta o cidadão das páginas políticas nos jornais, criando analfabetos que são funcionais apenas enquanto massa de manobra. O temor repele, fazendo com que o leigo não se interesse sequer em cogitar a hipótese de iniciar uma discussão sobre política com seu vizinho. Quando o faz, costuma sempre transitar naquela simplória conversa de elevador, criticando abstratamente questões que são essenciais em sua rotina diária. “Como pode o ônibus custar uma fortuna, sem nenhuma qualidade?”; “Em Curitiba não é essa vergonha, a rodoviária lá funciona que é uma beleza”; “Menina, essa chuva sempre transforma minha calçada em uma piscina, o prefeito nunca melhora isso”. O papo que dura uma eternidade de alguns andares termina sempre sem resoluções e poderia ter sido facilmente substituído pelo clássico: “Será que vai chover hoje?”. A política não pode ter a mesma importância que a popular vidência meteorológica.

Você pode e deve estimular o vizinho a pensar por si próprio, questionando e contra-argumentando, pois são as únicas ferramentas eficazes contra a cultura do medo. Você não pode ficar escravo de casos com apenas uma versão, pois é essa preguiça intelectual que cria em longo prazo os estereótipos, que fomenta o preconceito. Eu morro de medo quando escuto alguém responder mecanicamente, ao ser inquirido sobre algum tema específico, com frases feitas das manchetes sensacionalistas, repetindo a conclusão vendida pela mídia. O discurso político que deveria primar pela lucidez é então reduzido a uma batalha infantil de canalhas frases de efeito pró e contra o governo. O que deveria ser um debate racional se perde em um circo barulhento, um confronto que só favorece a manipulação de ambos os lados. E, tenha certeza, não seja ingênuo, os mestres de ambos os lados estão apenas preocupados com seus próprios bolsos, em manter ou conquistar o poder. Vivemos uma realidade sem a mínima qualidade de vida, sem moradia, sem transporte, sem saúde, sem educação, sem segurança e com altíssimos impostos. A internet fixa será limitada em breve, dando mais um passo largo em direção à Idade das Trevas. O povo morre esperando no chão das filas dos hospitais, a dona de casa morre afogada na garagem da sua casa com uma enchente, um mosquito se transforma num problema grave em pleno 2016. Caso você, consciente de todos esses absurdos, ainda se preste a defender a nossa classe política, sem meias palavras, tome vergonha na cara.

Você não pode se sentir confortável com apenas uma versão, deve questioná-la, contestá-la em debates, estudá-la a fundo. “Dona Maria, você leu sobre o caso do garoto que foi encontrado próximo da cena do crime?”, ela então responde: “Claro, aquele bandido tem que apodrecer na cadeia”. Dias depois, a imprensa solta um comunicado afirmando que o garoto foi inocentado, daí o discurso da Dona Maria se modifica: “Coitado do rapaz, aqui no Brasil é assim, só preto e pobre vai preso”. Temos que viver em uma sociedade onde a Dona Maria teria procurado outras fontes de informação, antes de formar sua opinião sobre o caso. E, hoje mais do que nunca, todos têm acesso à informação, basta apenas o essencial elemento do interesse.

Não tenha medo de discutir política, pois a sua passividade é que decidirá a nação que você deixará para seus filhos e netos. Você não tem que se adequar à mediocridade, estimulada especialmente pela medonha classe política brasileira, você precisa sobrepujá-la.

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