Não é bom falar sobre política, a incursão no tema, quando
você atua em qualquer outra área, pode até prejudicar carreiras, arrumar
inimizades. Esse é o conceito que aprendemos a seguir, ano após ano, eleição
após eleição. Mas silenciar algo tão primordial em uma sociedade não seria uma
forma fácil de nos eximirmos de qualquer responsabilidade sobre algo que
depende exclusivamente de nossas ações conscientes? Uma característica mais
representativa do medo do que da lucidez? E, analisando com maior atenção, não
seria uma explicação plausível para compreendermos o problemático estado atual do sistema político? Nós devemos temer ou respeitar? São perguntas
que deveriam fazer parte do inconsciente coletivo de um povo, não somente em
época de eleição.
“Não fala sobre política, isso pode te complicar”, seria um
parente próximo filosófico do terrível: “Se você soubesse como são feitas as
linguiças, você não as comeria”? Esse medo de entender o processo democrático é
o que afasta o cidadão das páginas políticas nos jornais, criando analfabetos que são funcionais apenas enquanto massa de manobra. O temor repele, fazendo com que o
leigo não se interesse sequer em cogitar a hipótese de iniciar uma discussão
sobre política com seu vizinho. Quando o faz, costuma sempre transitar naquela
simplória conversa de elevador, criticando abstratamente questões que são
essenciais em sua rotina diária. “Como pode o ônibus custar uma fortuna, sem
nenhuma qualidade?”; “Em Curitiba não é essa vergonha, a rodoviária lá funciona
que é uma beleza”; “Menina, essa chuva sempre transforma minha calçada em uma
piscina, o prefeito nunca melhora isso”. O papo que dura uma eternidade de
alguns andares termina sempre sem resoluções e poderia ter sido facilmente
substituído pelo clássico: “Será que vai chover hoje?”. A política não pode ter
a mesma importância que a popular vidência meteorológica.
Você pode e deve estimular o vizinho a pensar por si
próprio, questionando e contra-argumentando, pois são as únicas ferramentas
eficazes contra a cultura do medo. Você não pode ficar escravo de casos com
apenas uma versão, pois é essa preguiça intelectual que cria em longo prazo os
estereótipos, que fomenta o preconceito. Eu morro de medo quando escuto alguém
responder mecanicamente, ao ser inquirido sobre algum tema específico, com
frases feitas das manchetes sensacionalistas, repetindo a conclusão vendida
pela mídia. O discurso político que deveria primar pela lucidez é então reduzido a uma batalha infantil de canalhas frases de efeito pró e contra o governo. O que deveria ser um debate racional se perde em um circo barulhento, um confronto que só favorece a manipulação de ambos os lados. E, tenha certeza, não seja ingênuo, os mestres de ambos os lados estão apenas preocupados com seus próprios bolsos, em manter ou conquistar o poder. Vivemos uma realidade sem a mínima qualidade de vida, sem moradia, sem transporte, sem saúde, sem educação, sem segurança e com altíssimos impostos. A internet fixa será limitada em breve, dando mais um passo largo em direção à Idade das Trevas. O povo morre esperando no chão das filas dos hospitais, a dona de casa morre afogada na garagem da sua casa com uma enchente, um mosquito se transforma num problema grave em pleno 2016. Caso você, consciente de todos esses absurdos, ainda se preste a defender a nossa classe política, sem meias palavras, tome vergonha na cara.
Você não pode se sentir
confortável com apenas uma versão, deve questioná-la, contestá-la em debates,
estudá-la a fundo. “Dona Maria, você leu sobre o caso do garoto que foi
encontrado próximo da cena do crime?”, ela então responde: “Claro, aquele
bandido tem que apodrecer na cadeia”. Dias depois, a imprensa solta um
comunicado afirmando que o garoto foi inocentado, daí o discurso da Dona Maria
se modifica: “Coitado do rapaz, aqui no Brasil é assim, só preto e pobre vai
preso”. Temos que viver em uma sociedade onde a Dona Maria teria procurado
outras fontes de informação, antes de formar sua opinião sobre o caso. E, hoje
mais do que nunca, todos têm acesso à informação, basta apenas o essencial
elemento do interesse.
Não tenha medo de discutir política, pois a sua passividade
é que decidirá a nação que você deixará para seus filhos e netos. Você não tem
que se adequar à mediocridade, estimulada especialmente pela medonha classe política brasileira, você precisa sobrepujá-la.
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