Labirinto - A Magia do Tempo (Labyrinth - 1986)
A origem do projeto é o encontro criativo do desenhista
Brian Froud com o cineasta Jim Henson, tudo começou com a parte visual, o
enredo foi sendo pensado ao longo do processo. Mas é um equívoco ressaltar
apenas a eficiência da parte técnica, ou subestimar o filme como simples
diversão para o público infantil, ele não teria sobrevivido tão bem ao teste do
tempo caso não fosse enriquecido por um elemento mais nobre, um coração
pulsante que se faz audível por sobre todos os artifícios visualmente
encantadores, uma mensagem realmente poderosa e importante.
As referências a “O Mágico de Oz” e “Alice no País das
Maravilhas” são óbvias, os personagens da aventura são variações de pessoas
próximas da menina, como Jareth, o rei dos duendes vivido por David Bowie, que
toma a forma de Jeremy, o namorado de sua mãe, uma relação nascida nos palcos
de teatro. Ela se apaixonou e abandonou o marido e a filha para viver com o
colega ator, mas é vista pela garota com ternura, como um símbolo de coragem,
alguém que deixou o amor falar mais alto. A melodia de “As The World Falls Down”,
que toca na caixinha de música dada por ela, emoldura posteriormente a
sequência de dança da menina com o rei dos duendes no baile de máscaras, como
que fechando o ciclo. Jareth aparece em sua fantasia como o sedutor terreno
desconhecido dos relacionamentos adultos, com a aparência daquele que
conquistou sua mãe e a estimulou a se libertar de uma relação desgastada. A
arte corre nas veias da jovem Sarah, vivida pela bela Jennifer Connelly, que
encena diariamente em um palco imaginário as linhas de seu livro favorito: “Labirinto”.
E ela precisa encarar a realidade sem a dependência da bengala do escapismo, essa
constatação se manifesta em seu subconsciente de diversas formas, como quando
percebe que as fadas são como pestes que precisam ser dedetizadas, ou quando
descobre que as portas somem e reaparecem em locais diferentes, em suma, que o
mundo não é justo.
A grande missão da garota não é atravessar o labirinto do
rei dos duendes, nem se redimir da irresponsabilidade de querer que seu irmão
mais novo desapareça para se livrar da obrigação de cuidar dele, mas
compreender que não precisa deixar de ser criança para crescer. É linda a forma
como a mensagem é passada no roteiro, evocando o mundo mágico dos bonecos, com
toques sutis daquele senso de perigo contido nos melhores contos de fada, que
funciona como moldura para uma defesa apaixonada: que o adulto nunca perca
contato com sua criança interna. A fantasia é o porto seguro para o adulto
desesperançado, oprimido pelos obstáculos de um sistema onde a justiça não vale
nada, os valores são confrontados diariamente e a opção que parece mais
sedutora é aquela em que você precisa se corromper. Quando você se vê numa
encruzilhada, o melhor caminho é buscar honrar a sua contraparte infantil, pura
e gentil, intocada pelo cinismo e pelo ódio. A linda cena final, no quarto da
menina, sempre me emociona, lágrimas que abraçam carinhosamente um sorriso.
A jovem Sarah conquistou segurança e amadureceu em sua
aventura, está preparada para novos desafios, mas ela sabe que sempre poderá
acessar o mundo mágico de sua infância, a matéria dos sonhos, as lembranças doces
que, ao final de tudo, caso você tenha se mantido íntegro, estarão presentes aplaudindo
com entusiasmo o fechamento das cortinas no espetáculo de sua existência.
* O livro está sendo lançado pela "Darkside Books", com o trabalho gráfico de qualidade impecável que já se tornou sinônimo da editora. A edição conta ainda com ilustrações de Brian Froud,
artista e ilustrador de fantasia, e fascinantes cinquenta páginas do diário de Henson,
detalhando a concepção inicial de suas ideias para o filme.
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