Hana-Bi: Fogos de Artifício (Hana-bi - 1997)
A palavra japonesa Hanabi significa “fogos de artifício”,
mas com a inserção do hífen, ela se divide em “flor” e “fogo”, uma riqueza de
significados que se perde na tradução. O roteirista/diretor Takeshi Kitano é
mais conhecido em sua nação como um comediante televisivo, talento que fica
evidente na forma como ele insere o humor nas suas tramas. Ele vive Nishi, um policial
que atravessa o pior momento de sua existência. A filha perdeu a batalha contra
a leucemia, seu melhor amigo e parceiro profissional levou um tiro de um yakuza
e ficou paralítico, outro policial morreu na sua frente em uma ação comandada
por ele, e, para piorar, a sua amada esposa descobre que está com um câncer em
fase terminal.
Em seu rosto taciturno, a compreensão de que perdeu o controle,
a desgraçada lucidez dos moribundos, a fortaleza sombria de quem reconhece a
existência como uma superação constante de obstáculos. Sem qualquer razão para
nutrir esperança, ele aceita a beleza que encontra na solidão, motivado apenas pela
vingança. A opção característica do diretor pelo silêncio agrega poesia até
mesmo nas sequências mais violentas, o sangue na coreografia da morte pode
chamar atenção, mas somos lembrados que a mão que aperta o gatilho está
impulsionada por dor e culpa, o abstrato intensifica o estado de espírito do
agressor, o tiro pode ser sucedido em um jump cut para uma tela recebendo tinta
vermelha. Horibe, o amigo paralisado, em estado depressivo após o cruel afastamento
da família, encontra triste paz em suas pinturas, obra do próprio Kitano, onde
vemos a fusão de flores e animais, ikebana, a arte de arranjos florais
objetivando a busca do equilíbrio e a beleza na simplicidade, desejos que
encontram ressonância melódica na bela e melancólica trilha sonora de Joe
Hisaishi. A tragédia destruiu a família, o homem perdeu o emprego, por
conseguinte, deixou de ser útil e foi esquecido pelos seus entes queridos. Já
Nishi, homem correto e que sempre preservou sua família, acaba sendo levado à
marginalidade, chega a roubar um banco. A desconstrução do conceito familiar
como idealizado pela sociedade japonesa é um elemento fundamental no filme.
Nas
poucas vezes em que vemos o protagonista sorrindo, visivelmente desconfortável,
a esposa Miyuki está presente. A viagem do casal rende os momentos mais ternos,
o marido tentando garantir a ela plena felicidade em seus últimos dias de vida.
Em uma cena contundente, a mulher coloca flores mortas na água, um desesperado
grito contra o absurdo da finitude. A coragem da sequência final, a declaração
de liberdade do bravo policial, propositalmente testemunhada de perto por seus
colegas, carrega muito da honra samurai, o resgate de valores perdidos.
* O filme está sendo lançado em DVD pela distribuidora "Versátil", com a curadoria sempre impecável de Fernando Brito.
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