Como sempre faço, revi todos os filmes e conheci outros, na
tentativa de incluir nessa lista dez obras importantes, algumas subestimadas,
famosas e valiosos tesouros escondidos, sem ordem de preferência, com breves
introduções objetivando o despertar do interesse. Levei em consideração as
cinebiografias e roteiros que envolvam pintores, reais e fictícios, ou a arte
da pintura.
Sede de Viver (Lust for Life – 1956)
Com direção de Vincente Minnelli, Kirk Douglas, em grande
momento, vive Van Gogh, em um roteiro de estrutura linear, que se foca nos
conflitos internos do artista, sem romantizar o homenageado, expondo seu
gradual abraço na insanidade, com as telas exibidas durante as cenas, um
recurso que traz ainda mais elegância ao projeto.
Frida (2002)
Salma Hayek, em seu melhor trabalho, vive Frida Kahlo,
em um roteiro bastante fiel, sem se intimidar com os aspectos mais cruéis dos
vários obstáculos que ela superou, sem apelar para o melodrama piegas, e que
funciona como uma excelente introdução aos estudos sobre a pintora mexicana. E,
emoldurando a trama, uma fotografia impecável de Rodrigo Pietro.
Os Amantes de Montparnasse (Les Amants de Montparnasse –
1958)
Cinebiografia dirigida por Jacques Becker, que retrata o
atribulado último ano de vida do pintor italiano Amedeo Modigliani, vivido
pelo francês Gérard Philipe, depois que ele conheceu e se apaixonou loucamente
pela colega artista Jeanne Hébuterne. O roteiro se aprofunda no vício dele pelo
álcool, atormentado por seus fracassos, a incapacidade de vender suas pinturas
a um público que não compreende seu trabalho.
Agonia e Êxtase (The Agony and The Ecstasy – 1965)
A competente direção de Carol Reed equilibra os excessos
histriônicos de Charlton Heston, que vive o pintor e escultor renascentista Michelangelo,
com o roteiro focado na eterna disputa entre ele e o Papa Júlio II, vivido por
Rex Harrison, enquanto ele trabalhava na pintura do teto da Capela Sistina. A
trama tem problemas de ritmo, porém, isso é compensado pelos excelentes
diálogos, abordando a relação entre arte e fé, a impossibilidade de domar os
instintos de um criador ao delimitar o terreno de sua imaginação.
Andrei Rublev (1966)
A Rússia do século XV passa por um período turbulento, o
povo sofre injustiças e está fragilizado pela fome. Nesse cenário, acompanhamos
um pouco da vida do pintor Andrei Rublev, que mais tarde abandonaria seu
ofício para dedicar-se a Deus. Um dos melhores trabalhos do diretor Andrei
Tarkovski, uma obra-prima intimista do cinema mundial, que somente melhora a
cada revisão. “O que hoje é elogiado, amanhã será criticado e depois de amanhã,
esquecido. Eu e você seremos esquecidos. Todos serão. Tudo se resume a vaidade
e é transitório. Tudo gira num ciclo eterno. Se Cristo voltasse à Terra, seria
crucificado novamente”.
Edvard Munch (1974)
O diretor Peter Watkins, da pérola pouco conhecida:
“Privilégio”, comanda a cinebiografia, misto de documentário e ficção, do
pintor expressionista norueguês responsável por obras como “O Grito”. A opção
de filmar quase sempre em primeiro plano, buscando o que se esconde por trás
dos olhos, nas intenções dos atores, explorando camadas de narrativa
sobrepostas, oferecendo um retrato visceral da juventude de um artista que, em
vida, teve seus trabalhos hostilizados por grande parte do público.
Basquiat – Traços de Uma Vida (Basquiat – 1996)
O diretor Julian Schnabel, que viria a comandar o ótimo “O
Escafandro e a Borboleta”, nos transporta para a década de oitenta, abordando a
ascensão meteórica do jovem grafiteiro Jean-Michel Basquiat (Jeffrey Wright), que foi descoberto
por Andy Warhol, no cenário artístico contemporâneo. O roteiro se destaca pela
sensibilidade com que retrata o homenageado vanguardista, evidenciando o
preconceito racial e os meandros da indústria. “E nunca poderá se explicar para
alguém que usa os dons de Deus para escravizar, que você usou os dons de Deus
para ser livre”.
A Bela Intrigante (La Belle Noiseuse – 1991)
O processo criativo do recluso Édouard Frenhofer,
pintor fictício vivido por Michel Piccoli, que encontra sua musa renascida na
namorada de um colega. Depois de anos de inatividade e falta de inspiração, a
jovem revigora sua carreira artística. Obra pouco citada do ótimo diretor
Jacques Rivette, que merece ser redescoberta. Não se intimide pela longa
duração, quase quatro horas, esse é um daqueles filmes que você irá indicar
para seus filhos e netos.
Cristo Parou em Éboli (Cristo si è Fermato a Eboli – 1979)
Adaptação refinada, dirigida por Francesco Rosi, da obra
autobiográfica do pintor Carlo Levi, que relata o período de sua prisão
política domiciliar em uma atrasada e remota vila italiana, onde, longe dos
intelectuais, incapaz de exercer seu trabalho, o artista irá entrar em contato
com hábitos simples, misticismo religioso, e viverá experiências que irão fazer
com que ele reavalie sua função na sociedade. Outra obra pouco citada, que, com
certeza, entrará na sua lista de filmes favoritos.
Sonhos (Dreams – 1990)
Nessa última obra-prima de Akira Kurosawa, num dos
episódios, intitulado: “Corvos” (referência a “Campo de Trigo com Corvos”),
protagonizado pelo diretor Martin Scorsese, um estudante de artes descobre-se
dentro do vibrante e, por vezes, caótico mundo dos trabalhos de Vincent van
Gogh, durante uma visita a um museu de artes. Num passeio onírico pelas
telas, ele encontra o próprio artista e conversa com ele.
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