Após me aventurar na pancadaria de Steven Seagal, ainda
tentando me lembrar de suas tramas, decidi checar se essas duas fitas exóticas
não tinham se desmagnetizado. Para meu azar, elas funcionaram perfeitamente. Elas
são resultado do garimpo em uma tarde perdida na década de noventa, no mercado
popular da Uruguaiana, que os leitores cariocas provavelmente conhecem. As
fitas, na melhor das hipóteses, advindas de locadoras de vídeo que haviam
fechado, ficavam empilhadas do chão ao teto, sem nenhum critério, acumulando
poeira. “Leve 3, Pague 1”, gritavam os vendedores, mas, com um bom papo, você
conseguia negociar valores ainda mais baixos. Naquela época eu voltava para
casa com algumas sacolas, algo em torno de vinte fitas, com sorte, algumas bem
raras. A capa de “O Rato Humano”, sem dúvida, uma das mais vergonhosas do
formato, continha um aviso macabro: “Advertência – Aconselha-se ao público
impressionável não alugar esta fita”. Em meu cérebro isso significava: “Leva
logo, moleque!”.
Ratos (Rats – Notte di terrore - 1984)
O Rato Humano (Quella Villa In Fondo Al Parco - 1988)
“Ratos”, dirigido de forma incompetente, como de costume,
pelo italiano Bruno Mattei, pode até ser considerada uma obra-prima, quando
comparada ao espetáculo de vergonha alheia que é “O Rato Humano”, que será
analisado com a atenção que merece no próximo parágrafo. Ele começa com um
letreiro interminável, sempre um péssimo sinal, avisando que estamos assistindo
um mundo pós-apocalíptico, numa era intitulada criativamente de “A.B”: após a
bomba. Um evento tão impactante que substituiu a influência de Cristo na
contagem do tempo. Como todos os filmes no tema após “Mad Max”, somos
conduzidos obviamente para um cenário desolador habitado por homens de jaqueta
de couro, bandanas e lenços no pescoço, montados em suas motos possantes, com
estoque infinito de gasolina, elemento que surpreendentemente nunca se esgota
em mundos pós-apocalípticos. E, nesse mundo de homens e mulheres fortes,
castigados diariamente pelas intempéries, a simples visão de um corpo sendo
comido por alguns ratos leva as sobreviventes a gritarem desesperadamente. Nada
mais ameaçador que a possibilidade de contaminação por leptospirose, meningite
ou hepatite, quando se vive em um mundo aparentemente sem água, mas com
gasolina e munição infinita. Mas nada supera o desfecho, uma espécie de primo
pobre, estrábico, corcunda e gago de “O Planeta dos Macacos”, quando os
personagens descobrem que estão vivendo em um mundo de ratos humanos, um plot
twist tão impressionante que o aparelho, indignado, até mastigou o trecho da
fita.
“O Rato Humano” é dirigido por Giuliano Carnimeo, responsável
por “Sartana – O Matador”, aquele que considero o mais divertido na franquia do
Mandrake 007 do faroeste italiano, vivido por Gianni Garko. Uma produção da Fulvia
Films, que, numa exibição de politicamente incorreto ao extremo, coloca o
falecido Nelson de la Rosa, o menor homem do mundo, com 54 centímetros, escondido
por uma maquiagem tosca de rato, saindo de privadas para atacar suas vítimas. O
conceito, por si só, já faz o queixo cair, mas a execução é ainda mais absurda.
A fotografia do VHS é escura o bastante para impedir que tenhamos certeza se nós
estamos realmente presenciando os ataques, ou é nossa imaginação fazendo todo o
trabalho. Ao final, ficamos com uma sensação de profundo mal-estar, similar ao
que sentimos ao assistir o clássico “Freaks”, um sentimento sempre muito
bem-vindo em filmes do gênero. Então, de certa forma torta e bizarra, mesmo
sendo intensamente ruim, a fita satisfaz suas pretensões.
O Rato Humano é hilário, tenho um edição em dvd, com a tela em widescreen, é bem ruim, mas diverte bastante.
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