Richard Pryor
Em uma palavra: Caos. Ninguém controlava sua avassaladora
metralhadora verbal em seus espetáculos de stand-up comedy. Ele era o
ídolo de Eddie Murphy, porém não idolatrava ninguém. Nos palcos era o
equivalente a uma incontrolável floresta em chamas, no cinema era puro carisma,
mas em sua vida real era uma criança em busca de atenção. Complexado, o artista
não entendia como recebia milhões por seus filmes, enquanto sua avó havia
trabalhado como dona de um prostíbulo, onde sua mãe era uma prostituta e seu
pai um gigolô, e morrido na miséria. Em sua juventude passada praticamente toda
dentro do prostíbulo da avó, o jovem sofria com a pouca atenção dada por sua
mãe e com os constantes abusos, até sexuais, que sofria dos rapazes mais
velhos. Aprendeu então muito novo a utilizar o humor como “arma de ataque” e
com quatorze anos iniciou no teatro amador.
“Quando comecei, eu era um negro magrinho e de olhos grandes
capazes de conter o mundo, com um largo sorriso que implorava por atenção, mas
ninguém parecia ter tempo para me oferecer”.
Com o sucesso e uma cabeça perturbada vieram as drogas.
Houve uma época em sua vida em que cocaína era consumida tal qual um cereal
matinal. Seu ápice autodestrutivo veio quando em uma festa, ateou fogo em seu
corpo embebido em rum e jogou-se pela janela. Após vários minutos agonizando no
meio da rua, foi socorrido por uma ambulância e levado ao hospital. O óbito já
estava praticamente consumado, algo já esperado por amigos e colegas de
trabalho, que durante um bom tempo assistiram esta tragédia ser anunciada. Ele
sabotava seus projetos profissionais, chegando a conceder uma entrevista no set
de filmagens de “Loucos de dar Nó” totalmente fora de si, que pode ser encontrada no
Youtube, deixando o entrevistador chocado com seu estado. Já no hospital,
recebeu uma série de tratamentos excruciantes e algumas operações plásticas.
O renovado Pryor não se viu livre de seus demônios
interiores e retornaria aos velhos hábitos. Algumas tentativas de reconquistar
glórias passadas serviriam apenas para mostrar que, de certa forma, o criativo
comediante realmente havia morrido naquele incidente explosivo. Suas
participações em cinema, como em “Superman 3” e “O Brinquedo”, mostravam um
leão domado. Seus salários aumentavam, porém a satisfação e o desejo de lutar
já o haviam abandonado. Logo, os muitos anos dedicados ao abuso das drogas
haveriam de clamar seu preço, quando no set de filmagens de “Critical Condition”
(1986), tendo recebido o pedido do diretor para que refizesse uma cena, Pryor
simplesmente não conseguia mover suas pernas e levantar-se de sua cadeira.
Meses depois foi diagnosticado com esclerose múltipla. Nos últimos filmes que
realizou com seu amigo Gene Wilder, o ator mal conseguia se locomover entre os
cenários. Veio a falecer em 2005, após vários anos de sofrimento.
Gene Wilder
Em uma palavra: Ternura. O jovem judeu Jerome Silberman
adotou seu nome artístico aos vinte e seis anos após já ter participado de
algumas peças de teatro. O interesse pela arte nasceu aos oito anos, quando sua
mãe estava de cama em estado grave e o médico lhe pediu que tentasse fazê-la
sorrir. Muito tímido, desde jovem sofreu bullying por ser o único
garoto judeu em sua escola militar. Mais tarde conheceu o diretor Mel Brooks, que
na época era casado com Anne Bancroft, sua colega de peça na época, que lhe
convidou a fazer o papel principal em seu filme: “Primavera para Hitler”. O
jovem recebeu uma indicação ao Oscar como coadjuvante por sua brilhante
atuação.
“Eu não gosto deste show business, eu amo o cinema e amo
poder atuar para cinema”.
Seguiram-se muitos sucessos em sua carreira, como “A
Fantástica Fábrica de Chocolates”, “Tudo o que você sempre quis saber sobre sexo” e “O Jovem Frankenstein”, e Wilder se viu preparado para seu próximo
passo: a direção. Ele roteirizou, dirigiu e atuou em “O Irmão Mais Esperto de
Sherlock Holmes” (1975). Pouco tempo depois recebeu uma proposta de roteiro para
uma comédia de ação e disse que só faria caso seu parceiro em cena fosse o
então iniciante Richard Pryor. “Expresso de Chicago” fez um enorme sucesso e
foi seguido por mais um projeto autoral do artista, chamado “O Maior Amante do
Mundo”, onde emulava o clássico astro do cinema mudo: Rodolfo Valentino.
Em “Loucos de Dar Nó” (Stir Crazy – 1980) retomou sua
parceria com Pryor, que passava por sérios problemas com o uso abusivo de
cocaína. Todos os obstáculos que apareciam nas filmagens não impediram o sucesso
da obra. Já “Cegos, Surdos e Loucos” e “Um sem Juízo, Outro sem Razão” foram
recebidos pela crítica com menos simpatia. Havia nas telas o carisma da dupla,
porém a mágica sofria com os problemas de saúde de Pryor. Após essas duas
tentativas, Wilder parou de trabalhar com o cinema, se focando em participações
na televisão, chegando a ganhar um prêmio Emmy por sua colaboração na série
“Will e Grace”.
Richard e Gene
“Eu nunca havia improvisado no cinema, mas com Richard eu
sempre improvisava. Não havia outra maneira com ele”.
(Gene Wilder)
Em uma palavra: Amor. Duas pessoas com trajetórias de vida e
condutas radicalmente diferentes. Pryor, a metralhadora verbal inconsequente, e
Wilder, o doce e amável judeu, não cultivavam grande amizade fora das telas,
porém profissionalmente eles eram a dupla perfeita. Bastava colocar os dois
em cena para que as improvisações começassem. Todos que os assistem notam como
eles se divertiam gravando, como se respeitavam e pareciam se entender com uma
troca de olhares. O sucesso nasceu de forma espontânea, a dupla não era
artificialmente produzida pela fábrica de sonhos de Hollywood. Simplesmente
atendiam ao desejo do público que pedia mais filmes com eles juntos. A mágica
pode ser encontrada em seu ápice em: “Expresso de Chicago” (Silver Streak –
1976) e “Loucos de Dar Nó” (Stir Crazy – 1980). Nesses filmes pode-se
presenciar a dupla em ótima forma e com roteiros de qualidade. Assistindo-os, bate saudade.