O Cidadão Ilustre (El Ciudadano Ilustre - 2016)
Ao optar pelo caminho do autoaprimoramento constante, o
indivíduo conscientemente dá seus primeiros passos na estrada rumo à solidão. Quanto
mais aperfeiçoada a sensibilidade, mais irritantes se tornam os rituais sociais
envernizados pela mentira, quanto mais estimulado o desejo por aprender, mais
apreço pela simplicidade generosa e menos paciência com aqueles que necessitam
dificultar o discurso por pura insegurança existencial. A deprimente realidade
é que grande parte das pessoas se satisfaz sendo medíocre. O cidadão ilustre, o
escritor (Oscar Martínez) que conquistou o respeito profissional longe de seu
país representa a negação de tudo o que os acomodados de sua cidade natal desesperadamente
defendem. Ao aceitar o convite honorário e retornar após quarenta anos, o
veterano mestre das palavras identificou rapidamente o ímpeto que o fez querer
fugir outrora daquele coletivo de tolos, deselegantes, oportunistas, desinteressados,
agressivos e invejosos.
O roteiro envolve com humor críticas ferinas àquela
sociedade que, não muito diferente da realidade brasileira, prefere fingir não
perceber que o aroma fétido que os perturba diariamente advém da lata de lixo
que negligentemente esquecem aberta. A falta de pontualidade (o descaso do
motorista com o horário do evento de seu passageiro), a hipocrisia de
manifestar interesse temporário na obra de alguém apenas visando status social
(as palestras dele cada vez mais vazias, com pessoas visivelmente enfadadas), o
favorecimento injusto por interesse político (sequência do concurso de pintura),
o elogio que nasce por pura necessidade financeira (o estranho que pede uma
cadeira de rodas para o filho), a paixão avassaladora que busca apenas um
passaporte (a jovem que seduz o escritor na intenção de viver uma vida melhor
na Europa), o bronco estúpido que se sente superior por ter casado com a antiga
namorada do homenageado, em suma, o pior pesadelo na vida de alguém que lutou
tanto para ser uma pessoa melhor.
Mas há um elemento que compensou todos os absurdos vividos
por ele, uma réstia de luz que brotou de onde menos se esperava, o jovem
atendente do hotel, educado, de fala mansa, que, com toda delicadeza, ofereceu
seus despretensiosos escritos para a avaliação do visitante. Naquela cortês
figura que os clientes arrogantes nunca valorizam reside a matéria nobre que
jamais será reconhecida naquela cidade, o sonho profissional que nunca será
estimulado, a força de espírito que será pisada até se tornar uma lembrança
melancólica em uma rotina frustrante, o reflexo no espelho do veterano, a mão
estendida que implora por ajuda em uma massa de zumbis. E o homem, esgotado e
pronto para abandonar novamente aquele esgoto a céu aberto, dedica então preciosos
minutos para oferecer ao garoto o melhor presente de sua vida: esperança. Se
ele conseguir salvar pelo menos um indivíduo valoroso, a viagem terá valido a
pena.
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