quarta-feira, 6 de janeiro de 2016

"Os Oito Odiados", de Quentin Tarantino


Os Oito Odiados (The Hateful Eight - 2015)
Até mesmo na pior das hipóteses, nunca achei que iria me referir ao trabalho de Tarantino com esse adjetivo, mas, sim, “Os Oito Odiados” é um filme entediante. Um grandioso vazio costurado com toques do estilo característico do diretor, um olhar reverente aos clássicos do gênero (especialmente “Quadrilha Maldita”, de 1959) em sua apresentação (desde o nome do personagem de Samuel L. Jackson, uma espécie de Hercule Poirot do Velho Oeste, homenagem ao obscuro diretor de westerns: Charles Marquis Warren), porém, um olhar cansado, sem paixão. Diálogos previsivelmente longos em excesso, com aquela esperteza infantil de garoto irônico de condomínio de luxo tentando chocar os pais, traço recorrente em suas últimas obras, sendo defendidos por personagens caricaturais desinteressantes, em suma, uma aula de como desperdiçar um ótimo elenco. Os defeitos não são novidade, “Django Livre” também era protagonizado por tiras de cartolina ambulantes, mas, pela primeira vez, os defeitos estão inseridos em um todo que falha terrivelmente como entretenimento, não há diversão, com exceção de alguns bons momentos breves. O apelo para revisão é praticamente nulo.

O primeiro ato, uma longa hora, é uma piada curta e fraca contada por um gago, sem timing, sem ritmo, um fiapo de narrativa estendida ao nível do insuportável, com a trilha sonora original de Ennio Morricone, em tom épico, contrastando claramente com o blá-blá-blá unidimensional que está sendo executado. A trama é tão chata que me peguei, no meio de uma cena teoricamente importante, onde eu já deveria estar imerso nos conflitos em jogo, analisando como Tim Roth estava descaradamente emulando os trejeitos de Christoph Waltz. A ultraviolência que domina o terceiro ato, outra marca do diretor, aparece nesse caso como um bem-vindo despertador, ainda que sirva apenas como barulho, já que sequer havia memorizado os nomes dos personagens e suas funções. Vale salientar que, em um período de discussão sobre a representatividade da mulher na indústria, com protagonistas cada vez mais interessantes, não dá pra ficar incólume ao tratamento dado pelo roteiro à Daisy, vivida por Jennifer Jason Leigh, vítima de todo tipo de brutalidade, um saco de pancadas que resiste a tudo sem perder o olhar desafiador. Uma personagem forte ou uma masoquista inveterada? Pelo roteiro raso, não dá pra formar uma opinião.   

A opção pela restrição do espaço cênico, algo que sempre aplaudo em um roteiro, peca por funcionar apenas como um ambiente reduzido onde os personagens trocam diálogos redundantes e sem impacto narrativo. Não basta enfiar vários personagens em uma pequena sala de júri, “12 Homens e Uma Sentença” é brilhante por ter um roteiro inteligente que conseguiu, em menos da metade do tempo desse faroeste, criar tensão e tornar relevantes aqueles doze homens. Tarantino foi incompetente a ponto de não conseguir criar tensão e dar relevância aos seus oito. É curiosa a opção pela fotografia em 70 mm, com lentes anamórficas que prometem uma exploração maior com profundidade de campo e cenários amplos, elementos que não combinam com um filme de câmara passado quase que todo em uma cabana, local onde os personagens ficam isolados durante a maior parte do tempo. Argumentar que o escopo da imensa razão de aspecto favorece qualquer coisa nesse cubículo escuro é forçar a barra, querer enxergar desenhos em nuvens. Quanto mais eu penso sobre a trama, pior ela fica, uma grande bobagem.

Há um tremendo potencial no projeto, que poderia aprofundar a alegoria da cabana como uma representação dos Estados Unidos, algo que a frequentemente mencionada carta de Lincoln e a letra da canção dos créditos-finais, cantada por Roy Orbison, parecem evidenciar, porém, não dá pra afirmar que é uma metáfora executada de forma eficiente, já que depende da tremenda boa vontade do crítico em suportar o tédio e fechar os olhos para todos os problemas, preenchendo lacunas, procurando desesperado alguma réstia de luz.  O filme, fraca inclusão na filmografia de Tarantino, não merece tanto escrutínio. 

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