A Força do Mal (Force of Evil – 1948)
Joe (John Garfield) é um inescrupuloso e ambicioso advogado
que, representando um chefe do crime, quer unificar todos os controladores de
jogos ilegais em uma única e poderosa organização. Para fazê-lo sem o uso da
violência e sem transpor nenhuma lei, Joe precisará acabar com todos os
pequenos empresários do crime. Mas entre eles está seu irmão mais velho Leo (Thomas
Gómez).
Basta uma sessão do filme para perceber que estamos diante
de um noir diferente, estruturalmente à frente de seu tempo, um texto que exala
coragem e personalidade forte, qualidades que refletem o espírito do próprio
diretor, Abraham Polonsky, que, após essa sua obra de estreia, entrou pra lista
negra e ficou mais de vinte anos impossibilitado de exercer sua função. Não é
difícil entender, pela forma valente com que abordou o tema, que ele tenha se
negado a delatar companheiros para o comitê, sabendo que estava destruindo sua
carreira no processo, um verdadeiro artista.
Destaco o cínico monólogo do protagonista, grande momento de
John Garfield, sobre a imoralidade de se fazer o bem a troco de nada, uma cena
que dá o tom do filme, defendido por personagens inseridos em um sistema que
corrompe os idealistas, a “regra do jogo” na cidade, que é evidenciada como a
força do mal, conduzindo-os inexoravelmente à traição ou ao sacrifício, um
leitmotiv sem floreios que inspirou profundamente cineastas como Martin
Scorsese e Francis Ford Coppola, que claramente homenageou o impactante
desfecho na cena mais famosa de “O Poderoso Chefão”, o assassinato no restaurante.
Os diálogos são trabalhados em grandioso tom teatral, como uma tragédia poética,
Caim e Abel, ao invés da pegada usual mais realista do gênero, algo que confere
às sequências mais intensas uma característica quase de fábula.
Não há facilidade conveniente, coincidências que costumam
dominar as narrativas do gênero, apenas um foco generoso no aprofundamento
psicológico, segurança na execução, poucas sequências movimentadas, porém,
muita ação interna. Os simbolismos visuais, como as escadarias que representam
metaforicamente estruturas morais, dissecando o capitalismo em sua crítica,
ganham pontos nas revisões. A fotografia de George Barnes, pegando inspiração
nas pinturas de Edward Hopper, traduz o aprisionamento do homem em sua busca
por mais dinheiro, algo muito mais traiçoeiro do que qualquer femme fatale.
* O filme, versão restaurada, está sendo lançado em DVD pela
distribuidora Versátil, na caixa “Filme Noir, Vol. 4”, que inclui também, além
de ótimos documentários: “Rififi” (Dassin), “Por Amor Também se Mata” (Berry), “Corpo
e Alma” (Rossen), “Redenção Sangrenta” (Curtiz) e “Homens em Fúria” (Wise).
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