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10 – Terra em Transe (1967)
Paulo é um jornalista que tenta mudar a situação ao planejar a ascensão de um candidato supostamente oposicionista chamado Vieira e buscando o apoio do maior empresário do país para deter o avanço de uma multinacional estrangeira sobre o capital do país. Tudo começou bem; porém, problemas sociais e a corrupção arruinaram sua intenção.
Na obra-prima de Glauber Rocha, o poeta intelectual Paulo (Jardel Filho) mostra-se como grande parte da sociedade, desesperado para encontrar um porto seguro nas promessas de algum líder, alguma voz ativa. Sua grande estatura e compleição rochosa escondem uma alma frágil e amedrontada. Ele abraça o recluso conservadorismo de Diaz (magnífico Paulo Autran), que lhe foi útil durante um tempo em sua escalada social, porém cujo verniz foi descascando até exibir sem pudores uma megalomania doente, com um complexo de César que o faz trair quem seja preciso. Fascinado por uma militante (Glauce Rocha), acaba sendo atraído para uma voz menos arrogante, porém ainda mais hipócrita: Vieira (incrível José Lewgoy), um reformador populista que beija os pés do clero e promete representar a verdadeira voz do povo no poder. Um povo miserável, analfabeto e que não pensa duas vezes antes de aplaudir o agressor com as mesmas mãos que ainda recuperam-se das feridas do recente açoite sofrido. Paulo logo percebe que Diaz e Vieira estão interessados apenas no poder, nos privilégios.
9 – Um Rosto na Multidão (A Face in the Crowd – 1957)
A história gira em torno de um andarilho chamado Larry “Lonesome” Rhodes (Andy Griffith), que é descoberto em uma cadeia no nordeste do Arkansas por Marcia (Patricia Neal), uma produtora de um programa de rádio, e seu assistente (Walter Matthau). Ele se transforma numa estrela do rádio e da TV, da noite para o dia. Mas, à medida que a sua fama aumenta, o sucesso lhe dá mais poder.
Foi uma genial decisão do diretor Elia Kazan a escalação do comediante Andy Griffith para um papel dramático que o fazia sair de sua zona de conforto, como o popular apresentador de televisão que é convidado a utilizar sua fama como elemento facilitador na carreira política de um congressista insosso. O filme é ousado por ser um dos primeiros a abordar um tema extremamente atual: a influência manipuladora da televisão na política. Como o personagem de Matthau chega a afirmar brilhantemente: “Você precisa ser um santo para se negar a utilizar o poder que aquela caixinha te oferece”. O apresentador simplório passa a se ver como um deus da comunicação, o braço direito do presidente americano.
8 – JFK – A Pergunta Que Não Quer Calar (JFK – 1991)
Oliver Stone não só reconstitui o assassinato do presidente John Fitzgerald Kennedy, mas defende a tese polêmica de que o crime fora uma conspiração envolvendo revolucionários cubanos, a CIA e a própria cúpula do governo americano.
Nessa longa dramatização de várias teorias conspiratórias sobre o assassinato de Kennedy, a coragem de Oliver Stone se faz presente ao defender uma opinião controversa, com total senso de ritmo narrativo. O grande mérito é que o roteiro coloca o espectador imerso na investigação do corajoso protagonista, vivido por Kevin Costner, instigando questões pertinentes, fazendo-nos acreditar na legitimidade de sua batalha. Poderia Lee Harvey Oswald ter disparado três tiros em seis segundos? Por que tantas pessoas ligadas ao assassinato depois apareceram mortos em circunstâncias peculiares? A riqueza de informações é valorizada em revisões, fator que nesse caso melhora a experiência. Impossível esquecer o impacto da cena do encontro com o misterioso militar vivido por Donald Sutherland, em seu espetacular monólogo, que evidencia feridas abertas ainda hoje na política americana.
7 – Mera Coincidência (Wag the Dog – 1997)
Menos de duas semanas para a eleição e o presidente dos Estados Unidos candidato a um segundo mandato envolve-se em um escândalo que pode acabar com sua carreira política. Antes que o pior possa acontecer, entra em cena Conrad (Robert de Niro), um homem com a habilidade de manipular a imprensa e, principalmente, a opinião pública. Com a ajuda de Stanley (Dustin Hoffman), um famoso produtor de Hollywood, ele cria a perfeita distração: uma guerra de mentira.
É incrível como esse excelente filme é pouco lembrado hoje em dia. Como não se lembrar da guerra dos Estados Unidos contra as armas de destruição em massa que nunca foram encontradas? Nada melhor do que inventar um motivo mirabolante para desviar os olhos da população, como faz o produtor vivido por Dustin Hoffman, para salvar a pele do presidente que está metido em um escândalo sexual, mas precisa ser reeleito. Eles inventam uma guerra, forjando o herói que poderá salvar a nação de qualquer perigo. O espirituoso título nacional nasceu como resposta ao caso de Bill Clinton com sua secretária, ocorrido pouco tempo antes do lançamento do filme. Na vida real, Clinton oportunamente aproveitou para se empenhar em campanhas de bombardeio no Iraque e no Sudão, enquanto caíam por terra todos os esforços de seus assessores em promover sua imagem como um respeitável homem de família. A crítica mais contundente do filme é que vivemos uma realidade onde as guerras são criadas e manipuladas por homens da mídia, que organizam até seus “heróis” e “vilões”, com direito a temas musicais e pomposas adaptações cinematográficas, negociadas antes mesmo do som das bombas ter se dissipado. E essa realidade é extremamente perigosa, pois com o avanço da tecnologia, a câmera mente com maior facilidade. E quando o povo é estimulado a não questionar...
6 – A Mulher Faz o Homem (Mr. Smith Goes to Washington – 1939)
Inocente homem do interior (James Stewart) é convidado a se tornar senador dos Estados Unidos e aos poucos se descobre em um mar de lama que ameaça tudo o que ele acreditava em relação à bondade e ao caráter dos comandantes de seu país.
A mão de Frank Capra pode pesar no piegas em certos momentos, mas poucos filmes souberam retratar tão bem o esforço de um elemento individual íntegro em um covil de serpentes, arriscando-se a perder até sua sanidade, mas não admitindo que seus valores tombem ou sequer se curvem perante o que considera errado. O roteiro nos apresenta um símbolo das reais qualidades que deveriam ser comuns aos homens que ingressam na política, mas deixando clara a razão que impede que essas qualidades sejam valorizadas: o ser humano é ambicioso. Apenas as crianças, seres ainda não tocados pelo instinto predatório dos adultos, conseguem enxergar os méritos na aparente causa perdida do protagonista. James Stewart me fez acreditar em Jefferson Smith. No famoso e emocionante discurso final do personagem no julgamento, exaurido física e mentalmente após horas falando ininterruptamente, apenas seu caráter o mantinha de pé. Nunca me esqueço da breve tomada que mostra o tímido sorriso de encorajamento do juiz, mesmo sabendo das poucas chances do rapaz. O juiz sabe que todos deveriam ter aquela coragem, mas muito mais que isso, ele enxerga naquele alquebrado homem o motivo principal que o fez adentrar outrora em sua profissão.
Continua...
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