sexta-feira, 30 de março de 2018

"Tem na Netflix?"


A pergunta aparece com frequência em comentários de postagens sobre cinema, mas enxergo nela mais do que apenas o elemento precioso da curiosidade.

O indivíduo verdadeiramente interessado busca estar minimamente antenado, costuma alimentar o hábito da leitura de críticas, gosta de conversar sobre o assunto, por conseguinte, sabe quando o texto é sobre um projeto que está sendo lançado nas salas, ou aborda uma produção da década de 90 que já passou na televisão umas mil vezes. Numa comparação simples, o torcedor que é apaixonado por futebol sabe a escalação atual de seu time do coração.

Eu vivi o período das trevas, sem internet, caçando filmes em locadoras de vídeo, sonhando com imagens de obras retratadas em revistas de cinema, aguardando meses para conseguir um título raro em VHS, arqueologicamente procurando em sebos e bibliotecas as informações sobre os artistas e suas filmografias.

Aprofundando a reflexão, o ato de perguntar publicamente algo cuja resposta pode ser encontrada em questão de segundos pela própria pessoa em alguns toques na ferramenta de "Busca" da plataforma, corrobora o argumento da preguiça intelectual, logo, a tentativa de disfarçar o desinteresse galopante posando de cinéfilo devotado nas redes sociais. Como sempre reforço, a valorização do "parecer ser", ao invés do mais trabalhoso "ser". E, como crítico, creio que há conexão entre este comportamento virtual e, por exemplo, a constatação da deselegância e do desrespeito do público brasileiro na experiência coletiva da sala de cinema.

Enquanto a cultura for consumida cegamente apenas como fast-food, tapa-buraco, tolo passatempo, nós iremos dividir sessões com toques ininterruptos de celulares, conversas animadas sobre parentes exóticos de estranhos e uma quantidade absurda de lixo acumulado nas poltronas, em suma, variações terríveis da ausência de educação e empatia.

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