sexta-feira, 30 de setembro de 2016

"Heróis Esquecidos", de Raoul Walsh


Heróis Esquecidos (The Roaring Twenties - 1939)
Eddie Bartlett (James Cagney) é um veterano de guerra desempregado que se torna contrabandista de bebidas, trocando as batalhas por garrafas. Enquanto cresce seu império, Eddie enfrenta ameaças externas e internas, confrontos de gangues e traições.

Lançado em uma época onde a censura do Código Hays afetava tremendamente qualquer projeto sobre o tema dos gângsteres, “Heróis Esquecidos” teve sua história original, escrita por Mark Hellinger, transformada pelo brilhante diretor Raoul Walsh em um épico de contornos românticos que, devido à utilização frequente de jornais cinematográficos como recurso narrativo, servia também como recorte histórico de uma conturbada década, um início espetacular em sua parceria com os estúdios Warner. O herói de guerra que retorna para uma nação que o rejeita e se vê forçado a fazer dinheiro ilícito no submundo, até ter seu reinado interrompido brutalmente pela crise de 1929, uma visão romanceada do gângster como vítima do sistema, algo mais palatável para os censores. A sua ruína começa ao traçar como meta o amor de uma adolescente que sonha em ser cantora, vivida por Priscilla Lane, a satisfação de um capricho que vai conduzir ele ao trágico desfecho nos degraus da igreja. 

James Cagney, que somente voltaria ao tipo em “Fúria Sanguinária”, dez anos depois, ajudou no roteiro que era retrabalhado por Walsh, os diálogos eram modificados nos dias de filmagem, tamanha a cumplicidade que se formou entre os dois profissionais. O relacionamento estabelecido na sequência inicial entre os personagens de Cagney, Humphrey Bogart e Jeffrey Lynn, três soldados atirando contra um inimigo que o espectador não enxerga, ferramenta que propositalmente nega a empatia e reforça a estupidez do conflito, remete ao clássico de guerra: “O Grande Desfile”, de 1925, em um extremo oposto no tratamento da morte do inimigo. É interessante comparar o incendiário final de “Fúria Sanguinária”, onde o personagem de Cagney se mantém orgulhoso em sua ilusão de grandeza diante da morte certa, com o melancólico final de Bartlett, lutando pra se manter de pé após o tiro nas costas, com a expressão no rosto de quem percebeu tardiamente que o crime não compensa, com sua figura no enquadramento remetendo à Pietà, de Michelangelo, amparado pela devoção materna de uma dona de bar, seres em extinção na nova sociedade que se principia no horizonte. O mesmo diretor, o mesmo ator, dez anos de diferença. 

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