O filme acaba de ser lançado pela distribuidora “Classicline”,
em mais um trabalho primoroso de resgate da História da Sétima Arte.
Yolanda e o Ladrão (Yolanda and The Thief – 1945)
Uma linda e encantadora fantasia sobre o vigarista Johnny
Riggs (Fred Astaire), que em visita a um país latino-americano mítico, convence
uma herdeira ingênua (Lucille Bremer) de que ele é seu anjo da guarda. Mas ele
nunca imaginou que seus sentimentos por ela pudessem mudar tão rapidamente.
Essa bela fábula de Vincente Minnelli é afinada no diapasão lúdico
de “O Diabo Disse Não” (Heaven Can Wait), realizado dois anos antes por Ernst
Lubitsch. Mas diferente da obra do diretor alemão, que não sobreviveu bem ao
teste do tempo, esse musical se apresenta surpreendentemente moderno em seus
diálogos irônicos, provavelmente ignorados pelo público da época, que não
imaginava Fred Astaire como um trambiqueiro. Recebido de forma fria pela
crítica, conquistaria décadas depois o status de Cult. O roteiro de Irving
Brecher, com duas comédias dos “Irmãos Marx” no currículo (o que explica a
superioridade de sua escrita cômica), apresenta situações muito à frente de seu
tempo, ousadias (algo a ser aplaudido, considerando a fórmula dos musicais da
MGM) que poderiam passar facilmente como material para esquetes realizados hoje
em dia. Um bom exemplo ocorre na cena da banheira, com a personagem vivida pela
bela ruiva Lucille Bremer induzindo sua tia (Mildred Natwick, cuja última
participação em sua longeva carreira foi no excelente “Ligações Perigosas”) a
pensar que ela estaria desesperada para encontrar um homem, quando na realidade
ela queria tocar pela primeira vez em um telefone. A cena é conduzida com
sutileza e ótimo timing.
Outro ponto que se destaca é a fotografia de Charles Rosher
(responsável pela obra-prima do cinema mudo: “Aurora”, de Murnau), que aliada
ao design de sets realizado por Edwin B. Willis (entre outras colaborações,
trabalhou em “O Mágico de OZ”) e Cedric Gibbons, utiliza como inspiração os
trabalhos surrealistas de Salvador Dali. O resultado é muito interessante, com a
inocência da jovem encontrando ressonância imagética no mundo em que ela
habita. As músicas de Harry Warren e Arthur Freed (“Angel”, “Coffee Time”, “Will
You Marry Me?”, “This is a Day for Love” e “Yolanda”) não representam o melhor
trabalho da dupla, mas emolduram com elegância o roteiro. E como não citar o
maravilhoso, pioneiro (ainda que tenha sido utilizado em menor escala em produções
anteriores) e onírico balé de quinze minutos, coreografado por Astaire e Eugene
Loring, elemento que é injustamente pouco citado, normalmente substituído nas listas
de críticos pela longa sequência de balé no superestimado “Sinfonia de Paris”
(feito seis anos depois) ou pelo ótimo “Os Sapatinhos Vermelhos” (de 1948).
É uma pena que o fracasso do filme em seu lançamento tenha
desencorajado Astaire de continuar arriscando. Ousadias como essa, caso houvessem sido incentivadas, poderiam ter dado uma sobrevida ao gênero dos musicais nos anos
seguintes, exatamente no período em que a fórmula deles começava a demonstrar
sinais de cansaço.
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