domingo, 10 de dezembro de 2017

"Como se Tornar o Pior Aluno da Escola", de Fabrício Bittar


Como se Tornar o Pior Aluno da Escola (2017)
O roteiro escrito por André Catarinacho e Danilo Gentili é bom no gênero, as piadas funcionam, a montagem é esperta e entende o público-alvo, mas há algo que incomoda e prejudica o resultado, o problema não é raro no cinema nacional, a atuação do elenco não está afinada no mesmo diapasão, existem personagens que se mostram mais caricatos, outros adotam tom mais natural, além de alguns que simplesmente não atuam bem, o que acaba formando um conjunto irregular que distrai a atenção do espectador em algumas sequências. Com esta ressalva, vale destacar a importância da nossa indústria abraçar vertentes diferentes dentro da comédia, a (extrema) ousadia temática politicamente incorreta de “Como se Tornar o Pior Aluno da Escola”, especialmente nos dias de hoje, deve ser aplaudida. Arte é escapismo, aqueles que criticam, por exemplo, a celebração do bullying no filme, com o perdão da expressão, são apenas imbecis. E digo isto como alguém que sofreu na infância e adolescência com violência física e psicológica e escreveu um livro abordando o assunto.

A trama capta com exatidão a essência nonsense e debochada do cinema adolescente dos anos oitenta, aquela época maravilhosa em que o estudante chegava em casa, jogava a mochila no sofá e ligava a televisão para ver “Primavera na Pele”, ou “Férias do Barulho” no vespertino “Cinema em Casa” do SBT. Exatamente por este motivo é tão agradável reencontrar o eterno Quico de “Chaves”, Carlos Villagrán, vivendo o diretor da escola. Eu destaco também a presença sempre competente de Moacyr Franco, mestre do minimalismo brilhante, vivendo um faxineiro rebelde. Ótima ideia trazer de volta Joana Fomm, grande atriz que merecia ter tido participação mais expressiva na tela grande em sua carreira. E também é curioso ver Rogério Skylab, músico exótico especialista em subverter e chocar, vivendo um professor de História relativamente sisudo e cleptomaníaco, boa sacada. Os jovens protagonistas, Bruno Munhoz e Daniel Pimentel, apesar de não terem experiência na área, transmitem segurança e ótimo senso de timing cômico. Danilo Gentili não é ator, mas utiliza sua experiência como comediante nos palcos para injetar generosa dose de carisma ao viver uma espécie de versão adulta e mais cínica do Ferris Bueller, de “Curtindo a Vida Adoidado”, desencantado com a vida e que se torna o mentor da dupla.

Um aspecto interessante que engrandece a obra é propor a discussão sobre o conceito equivocado que escraviza o indivíduo, desde muito novo, ao reducionismo existencial que busca notas altas e incentiva um comportamento padronizado. Se você não se sente confortável no molde, logo, você é excluído. Um sistema educacional que valoriza a memorização, ao invés do real aprendizado. Na sequência em que o personagem de Gentili ensina que o certo é rasgar livros, a professora está indicando a leitura de “Iracema”, clássico de José de Alencar. A crítica é certeira, não há nada pior que inserir (com o acréscimo terrível da obrigação) no currículo escolar de pré-adolescentes tomos pensados para leitores adultos. Não é a maneira mais inteligente de incentivar o hábito precioso da leitura. 

A reflexão é fundamental, vivemos em um país com índices vergonhosamente baixos em educação. Talvez ser o “pior aluno” em um sistema inegavelmente falido pode representar alguns passos na direção certa.  

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