The Room (2003)
Você já viu “The Room”? Então, antes de ler o texto, procure
o filme no Youtube, ou em qualquer canto obscuro da internet, a experiência não
vai mudar sua vida, mas pode fazer com que você passe a repetir frases do roteiro
sem motivo algum, ou imitar os maneirismos do trágico personagem vivido por
Tommy Wiseau. Há o risco de causar dependência, especialmente se você sentir a
necessidade de rever no mesmo dia a versão que agrega o áudio de uma exibição
noturna na sala de cinema com fãs. O registro também está disponível. Creio que
esta pérola do gênero “tão ruim que é bom” vai ganhar maior reconhecimento após
a estreia nacional em janeiro de “Artista do Desastre”, dirigido e protagonizado
por James Franco, que aborda os bastidores desta cultuada bomba.
Wiseau, nascido na Polônia, escreve, produz, dirige e atua,
sem talento para qualquer uma destas funções. É impressionante o nível de
estranheza que as cenas induzem no espectador, que sente estar prestigiando um
filme pensado por alguém que nunca viu um filme na vida, ou melhor, um
alienígena mostrando a visão que alienígenas teriam sobre o comportamento e o
cotidiano dos seres humanos. Não dá para sintetizar a sensação, você precisa
tomar coragem e enfrentar este que já foi citado como o “Cidadão Kane” dos
filmes ruins. O título sem ligação com a trama, tomadas panorâmicas
intermináveis e repetitivas, movimentos de câmera absurdos, uma cena de sexo
que se repete em momentos diferentes, vale salientar, primeira vez em que
alguém transa com o umbigo da mulher amada, uma televisão posicionada logo
atrás de uma poltrona, porta-retratos na sala com imagens de colheres, portas que nunca são fechadas, a mania
irritante de vestir smoking para jogar bola, subtramas e personagens que
aparecem do nada e se vão sem sentido algum, falhas técnicas amadoras e que
realçam a péssima atuação de todo o elenco. Parece novela brasileira antiga, os
personagens não conseguem iniciar um diálogo sem citar o nome do interlocutor,
o que faz com que você memorize todos em pouco tempo (e tenha vontade de se
matar no processo). E quando a sogra do protagonista revela no meio de um papo
tranquilo com sua filha, sem mudança de expressão, que está com câncer de mama?
A jovem não se abala e segue o papo como se nada tivesse acontecido. É impossível
segurar o riso. A sequência mais incrível ocorre no terraço, quando Johnny (que
é chamado frequentemente de Tommy) dá uma aula de atuação preciosa ao emendar
um suave “Oi, Mark”, segundos depois de extravasar toda sua raiva com a vida
que estava levando.
Não é uma comédia, o drama é tocado pela equipe com
seriedade, as gargalhadas brotam no público naturalmente. Na sessão para fãs,
algo similar ao que ocorre com “Rocky Horror Picture Show”, o caos é hilário,
as pessoas jogam colheres na tela sempre que os porta-retratos aparecem no
filme, eles repetem todas as falas, o fenômeno é surreal. O elenco até preparou
um mockumentary atual sobre a obra, eles entraram na brincadeira e estão
ganhando uns trocados com esta fama inglória. Eu morro de vergonha, mas curto
bastante esta bela porcaria.
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