O Rapto do Menino Dourado (The Golden Child - 1986)
Esse filme, com a dublagem espetacular de Mario Jorge, fez
minha infância mais feliz. Em uma época sem internet, a garotada ficava
repetindo na sala de aula as frases do filme, como: “Eu quero o punhal”, “Não, nem
morto, nojo”, “Só quero umas batatinhas”, “Viva o Nepal”, “Tira essa meleca do
casaco antes que ela congele e arranhe você”, “É a continuação de um livro
chamado: Tora Doce, sobre toras confeitadas”, “Você viu um anãozinho hare
krishna nu por aí, correndo com uma nota de cem dólares? ”, “Me engana que eu
gosto” e “Parece um bagulhão, passa a língua e fuma”. E todos entendiam o contexto,
porque ele havia sido exibido na “Sessão da Tarde” do dia anterior. Lançado na
mesma época que o tematicamente similar “Os Aventureiros do Bairro Proibido”,
muitos se referem a ele como um dos primeiros escorregões na carreira de Eddie
Murphy, não consigo entender o argumento, considero superior a “Um Tira da
Pesada” e “48 Horas” juntos!
O roteiro foi escrito por Dennis Feldman, responsável por um
dos melhores filmes adolescentes dos anos oitenta: “Quase Igual aos Outros”
(Just One of The Guys), inserindo o tipo urbano malandro de Murphy em um cenário
de exótico misticismo, com personagens que poderiam ter saído das aventuras
fantásticas de Ray Harryhausen, como a mulher dragão. O equilíbrio perfeito
entre humor e ação dá o tom da missão que é dada pela linda Charlotte Lewis ao
investigador especializado em localizar crianças perdidas: Salvar o Menino Dourado,
a criança que nasce a cada mil anos com o poder de espalhar o bem, ou o mal,
pela face da Terra, das mãos do demônio vivido com sobriedade shakespeariana
pelo sempre competente Charles Dance. O projeto inicialmente seria
protagonizado por Mel Gibson, mas acabou tendo que ser modificado radicalmente com
a entrada do comediante que estava em franca ascensão. O diretor Michael
Ritchie vinha do sucesso com “Fletch – Assassinato por Encomenda”, veículo para
Chevy Chase. É perceptível que ele deu sinal verde para improvisações, o elenco
se mostra bastante relaxado, sentimento que é transmitido para o espectador e
consegue transformar diálogos, no papel, comuns, em material cômico de alto
nível.
Vale destacar o exemplo mais deliciosamente cara de pau de
product placement, a cena da latinha dançante de Pepsi, ao som de “Putting on
the Ritz”, produzida pelos magos da ILM, de George Lucas, utilizando técnica
pioneira que depois seria trabalhada em “Uma Cilada Para Roger Rabbit”. Para a
criança brasileira que estava acostumada a ver o Bocão da Royal jogado de
qualquer maneira nas cenas dos filmes dos Trapalhões, esse refinamento
publicitário era uma lufada de ar fresco.
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